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Mais uma voltinha em torno do Sal

20/5/2024

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Fotografia
​É das poucas que ainda me liga no Natal a desejar boas festas.
São chamadas sempre estranhas, porque nunca sabemos o que dizer.
Nos pontos baixos da sua vida, convida-me para jantar, vou desconfiado sempre à espera que dê o primeiro passo, para a poder acusar de falta de vergonha. Depois arrependo-me.
Nunca se lembra de mim quando a vida vai alta, ou o telemóvel silencioso. É nos períodos de vacas magras que me mostra o índice de respeito que tem por mim. A verdadeira forma como me vê.
 
E eu acabo por nada dizer, apenas observo. Observo e calo-me. Finjo que nada sei sobre a forma como existem, a sua vida interior, as suas contas de merceeiro. Quando são chatas, finjo que me zango. Quando quero que se afastem de mim, ligo a toda a hora e conto-lhes as minhas inquietações filosóficas, ou melhor ainda, tento ensiná-las a fazer introspecção de Freud a Jung.
Nesses momentos, para elas, o sumo deixa de merecer o aperto, e largam-me da mão, com a crença reforçada que sou um conas, ou pelo menos, um plano E, F ou G, a usar quando choverem bombas de cogumelo sobre o mundo.
 
No final de cada manipulação, quando consegui afastar a fonte emocional instável, do meu limiar de consciência, a minha própria biologia ralha comigo. Sou inundado por um sentimento de remorsos e ânsia de voltar a ligar e a ver o que fazem, o que for preciso para as ter na cama de novo. A minha biologia quer mandar em mim, e que eu derrame esperma para dentro de um útero.
Quando a racionalidade leva a melhor, inunda-me de todo o tipo de hormonas, para fazer reverter a situação. O pito era raro na savana. E a consciência hoje, com as mariquices de não querer tirar partido da fraqueza do outro, não está cá para essas ‘animalidades’ saudáveis.
 
Uma ou outra dizem que as odeio, que se nota na escrita e na forma como descrevo as mulheres. A algumas digo que sim, que as odeio por não serem como eu gostaria que fossem, aquela merda do mito da alma gémea, que a bem dizer é uma pirosice de primeira apanha.
Estou marreco de saber que partilhar a visão sobre este assunto, me torna aos olhos dos outros, como o estereotipo do mau amante. Daquele que sem arte ou encantos naturais, cospe no prato em que gostaria de comer.
«-Odeias as mulheres e odeias as mulheres que são livres e empoderadas.»
Rio-me, é a mesma merda de conversa, de repetição de papagaio, que soa bem. Ideias repetidas e ouvidas primeiro noutro lado qualquer. Regidas, algumas, por esta consciência não ruminante que não se interessa em descobrir a veracidade do afirmado, apenas, fruir a ideia de ser o centro do universo de qualidades e magias.
É tão bom, dócil e narcótico, sentir que temos as cartas da vida na mão. Uma cara bonita, um bom rabo e seios bem feitos e ‘amandados’ para a frente. Como soldados destemidos em guerra de trincheiras.
E de repente o mundo é a nossa ostra, vídeos idiotas no instagram, ainda mais idiotas no tik tok, com poses cada vez mais próximas da pornografia clássica, que faria corar de vergonha muita actriz dos anos 70, de hardcore.
O rabo com o rego num poste de iluminação, a objectiva filmando por trás, enquanto ela se baixa para atar os atacadores. Alusões directas ao sexo e ao poder de manipular a rebarba do espectador, que paga e se amontoa aos magotes, em casa no trabalho, atrás do teclado, aliviando a tensão lúbrica assim acumulada.
É uma maravilha ser mulher, arrebanhando assim o maior número de pretendentes como a mulher de Ulisses, para quando decidir, poder escolher o melhor. Vês, o poder sexual nada tem que ver com os gajos, mas com essa satisfação existencial, esse sentimento transbordante de se sentir bem nos seus sapatos. Essa sobre identificação com o seu corpo, proporcional à amargura mais tardia, quando o corpo decai. Estas gerações de há 20, 30 anos atrás, não aprendem. Estão agarradas à droga que é a lembrança de como um dia foram desejadas. Continuam a olhar para o seu corpo, o corpo em que outrora viam tudo de si, e a ver que o mesmo não mudou, aparentemente. E mesmo que mude, a beleza está no interior, agora. Agora querem ser apreciadas pelo que nunca ou quase nunca foi preocupação…a sua personalidade, as suas qualidades pessoais de ser humano que caga e mija como os demais.
 
E continuam também, a ver os homens que não lhes interessam, como uma res extensa, uma coisa aí, feita para lhes aliviar a existência, sussurrando elogios.
Aqueles que interessam, serão lavadinhos e enxugadinhos, pela mesma consciência que lhes veda a verdadeira e objectiva apreciação do seu corpo decadente.
Boa parte, pelo que tenho visto, apercebe-se difusamente, da falta de uma ética adulta, e de uma actualização de crenças. E só vêem dois caminhos. Ou o da aceitação da nova realidade que se estende até à cova, e do fazer das tripas coração, considerando a velhice como sinal de maturidade e censurando os homens que desejam mulheres mais novas…ou…escolhendo de novo o caminho mais fácil, da religião coca-cola, dos espanta-espíritos, do feng shui, das vibrações dos cristais e da astrologia, tudo de modo a reconfirmar a velha crença de que o bicho mulher tem acesso privilegiado aos segredos do cosmos, um papel místico que os homens não entendem, presos nas suas limitadoras lógicas e matemáticas, opressivos, agressivos e básicos. Duas cajadadas, elevam-se ao patamar de semideusas, e rebaixam-nos ao patamar de adoradores, de repasto do seu ego.
Por isso não espero grandes assomos de ética e consideração por parte de qualquer mulher, que possa ser interessante e ter interesse por mim. Sei o que a casa gasta. Sei que cordéis a puxam, sei quem é o titereiro, e por mais desejo que tenha de encontrar a excepção, sei que me calhará sempre a regra.
E por reconhecer em mim, o mesmo onomaturgo nocturno em acção, não as consigo respeitar, precisamente por dele não terem consciência. Como respeitar um animal selvagem que nos morde quando o tentamos resgatar de uma qualquer morte, de onde não consegue sair?
Temos de retirar a mão e lamentar que não tirem o pé do acelerador enquanto passam por nós em direcção à inexorável parede.
Só podemos lamentar.
«-Credo João, estás tão amargo.»
Havia-me pedido para ir ter com ela ao bowling, que me pagava uma cerveja, e acabámos por jantar, e passear, ao som dos grilos e da lancha da polícia marítima que persegue os mariscadores no estuário.
A conversa não acabava, e fomos para o bar onde nos conhecemos.
Eu com dois copos começo a falar e não me calo.
Ao ouvir-me, retirou as duas mãos em concha onde prendera a minha.
Olhei para ela e alguma clareza de pensamento fez-me revisitar a questão que colocara a partir do momento que ligara para mim.
«-O que é que esta quer?»
Num momento de desconfortável silêncio entre nós, ela diz: «-Vi um anúncio na tv e lembrei-me de nós, desta relação de amizade de há anos…»
«-Relação de amizade?» ri-me e perguntei.
Como forma de alívio das indagações prévias sobre as suas intenções, soltei umas audíveis e sonoras gargalhadas.
«-Estás parva? Amizade? Mas desde quando é que o que se passa entre nós é amizade? Não sei que relatos é que contas a ti mesma, para puxar lustro à tua consciência, mas eu não estou aqui por te considerar ‘amiga’. Até porque não serves para tal.»
Contei os segundos até vir a pergunta de volta, básica e a pegar no que menos importante eu dissera.
«-Como é que me consideras? E porque não sirvo para amiga?»
Sabia que a irritava não respondendo logo ao que mais lhe interessava ouvir.
«-Eu sei que merda de anúncio é esse. É o da super cock, que para variar é um hino à espiritualidade feminina e ao mito de ser-se amada independentemente do corpo, e ao longo dos anos.»
«-Á espiritualidade feminina? Como é que é?»
«-Não tens estado a ouvir o que tenho dito?»
«-Tenho…»
«-Como é que podes apascentar a ideia do amor cortês como maior forma de ligação entre duas pessoas, a seguir ao amor filial, e no momento a seguir, louvar a ‘amizade’, em que um homem quer o teu bem, mas não te quer a ti? Achas que a não afectação sexual, por ser desinteressada, é superior ao interesse intenso de desejar fundir fôlegos? Não vês nenhuma contradição nisso? Que merda de redução é essa que me fazes ao papel de amigo? Que ilusão é essa de me reduzires a algo de confortável na tua narrativa do mundo? Em que medida tenho eu de participar nela para te ajudar a convencer do que gostarias que fosse verdade? Queres mesmo que olhe para a pared azul que dizes que é amarela e diga que é amarela?»  Confesso que me exaltei um pouco, irritado pela redução que fez de nós, a algo agradável ou a caminho de, porque lhe dava mais jeito, alijava culpa e ajudava a acreditar em finais de histórias felizes. Era a isto que os homens estariam reduzidos? A phones de ouvidos de histórias reconfortantes?
​
A citada lógica dos broncos não lhe interessava.
«-Como me vês e porque não sirvo para amiga?»
«-Vejo-te com os olhos. E não serves porque és só mais uma cabra egocêntrica que anda por aí. E não tens nenhuma culpa disso.»
«-Olha, se é para me estares a chamar nomes, vou-me embora.»
Puxou pelo bluff.
Ok.
Levanto-me e levo a mão ao bolso para ir pagar a despesa.
Agarra-me de novo a mão e pede-me para me sentar.
Sento-me mas com a perna desviada para poder sair imediatamente.
«-Deves achar que sou o bócó que escolhem sempre para actor neste tipo de anúncios publicitários.»
«-Eu sei que tens razão.»
Era só isso que eu precisava ouvir.
E agarrei-lhe as mãos também, sabendo que não podíamos estar muito tempo de olhos nos olhos sem nos beijarmos e lembrarmos das mágoas e exultações passadas.
Pelo menos até que ela viesse de novo tentar fazer-me gaslighting, para ela ou para mim sobre a minha percepção e experiência. Reduzindo amor ao bócó do anúncio.
Como sabia e sei, que voltará a fazer, porque o dragão dela não sou eu, é ela mesma, e por isso não odeio nenhuma. Elas não sabem nem querem saber.
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