«Ele bem queria, mas travei-o a tempo. Ele queria parecer leviano, claro, mas a leviandade só fica bem às mulheres. Nos homens parece indiferença. O que nas mulheres é sinal de alegria, é neles um prenúncio de desprezo por tudo o que tem valor na vida. As mulheres levianas parecem ter tomado uma decisão positiva. Os homens parecem ter desistido.»
MEC, A vida inteira I Havia regurgitado sémen pouco tempo antes para o chão da sua cozinha. Tinha observado a sua cara de fêmea dominadora insegura mascarada de submissa. Olho agora o falo testemunho da cómica natureza humana. Inerte, flácido,adormecido, esquecido no vale das minhas pernas, sem desejo, saciado. Quando amor não há, ejacular a nada sabe. II Tenho-me divertido a observar a dissimulação feminina. Uma relação heterosexual é uma montanha russa de diversão. Ambos fingimos. Eu finjo que sou um puro, por vezes um pensador, quase sempre um desconfiado, mas no fundo sou sempre um espectador necrófago e observante à espera de ser surpreendido. Os olhares, as entoações de voz, as reacções faciais nas disputas lógicas, são as migalhas com que alimento a minha dissimulação, para conseguir o que quero E eu quero quero tanto compreender o humano, o feminino, que é o que mais me interessa. III Agarro a minha glande impedindo-a de cuspir para o chão. Tanta merda para isto. Até os desejos de luxúria venal se dissolvem. Vazios, começa a clarear a nublina da mente, e já só quero fugir dali, dos mirrados gémeos das pernas. Leva o amor grande dose de auto-hipnose, e não sabemos jogar connosco. Por isso nos nascem os amores tão infelizes. O cadáver que fica é só a lembrança do amante que partiu, não como corpo, não como malícia, mas como mais uma rosa que cheirámos na floresta.
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eugosto de letras Arquivo
Abril 2019
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