O que é a autodestruição?
Aquela força que age a partir de nós para nos destruir? De onde vem este prazer em armadilhar cada passo do nosso trajecto, quando não temos a coragem de responder aos filhos, e filhas, da puta que nos fizeram mal? Que cobardice é esta de foder a vida a quem sabemos não nos poder responder em género, nós? Que acontecimentos no passado dão carta de alforria às vozes interiores que nos habitam, para martelarem, dia após dia, o seu diálogo de desprezo para connosco? Come aquele doce, bebe aquela cerveja, descarta aquele amante. Más instruções que nos colocam numa região de infelicidade onde nos sentimos em casa. Odeio-me por ter sido cobarde, odeio-me por não ter impedido aquele ovo esmagado na minha cabeça no Carnaval, ou por me ter ajoelhado em frente a uma bardajona para que não me deixasse, ou não ter desfeito a cara de um cabrão que me apoquentou na C+S. Odeio-me por não ter lutado por mim. Este ódio, transmite-se como cólera, aos outros, que acham que é normal retribuir ódio por agravos que não lhes cometi. Falam com as amigas putas, sobre a minha falta de amabilidade, outros novos prospectos no horizonte, especialmente em amigas que também encornam os maridos à primeira oportunidade, nos corredores das fábricas onde trabalham. As amigas putas dão conselhos, que elas próprias não seguem. És uma princesa, ele está abaixo de ti, mereces tão melhor. Pipl que não fossem os pais ou o marido e estariam num qualquer pardieiro alugado a tentar perceber onde a vida descarrilara, após as promessas egocêntricas da adolescência. Mas dão conselhos sobre o senhor lei, o senhor massagem com final feliz, ou sobre o senhor com jipes na garagem. Tudo para forçar uma ruptura que torne a ‘amiga’ num reposteiro mais disponível, e que não reflicta na sua própria vida o opróbrio de relacionamento falhado por contraposição com outros. Mas não posso censurar, cada um sabe de si e Deus sabe de todos. Cada indivíduo é responsável pelas suas escolhas. Não sei que merda de cerveja me invadia o cérebro, mas fez-me inclinar a cabeça para trás e fechar os olhos com a nuca encostada à parede. A garçonete veio pedir pagamento e já tinha uma nota de 50 euros à sua espera, porque eu não queria falar com ninguém, sem saber aonde me levava o torpor. Ouvi-a depositar o troco e sair com nojo, da mesa de mais um ébrio. Abri um olho e vi que tinha idade para ser pai dela, mas facilmente lhe faria o que nenhum pai deve sequer imaginar. Recolhi as moedas e notas remanescentes, e entregue a mim, e à procura da razão do meu ódio, uma mão fria pousa sobre a minha testa. Ela chegara, e estava exultante como sempre. Pressinto que quer mais do que não me falta para dar. Em inglês arranhei que lhe dou um fodão a seguir à próxima cerveja, e ela finge, com alguma indignação verdadeira, que vem ter comigo para algo mais que foder. Eu sei. Sou boa companhia, quando não estou a ensinar como se faz introspecção. Tento fugir da minha cruzada perguntando-lhe pelo seu dia na universidade. Ela foge da conversa e tenta convencer-me sobre o seu interesse genuíno na minha pessoa, perguntando-me ideias sobre um paper sobre Kierkegaard e o tempo. Sabe bem que quando começo a falar não me calo mais. Consigo ser forte. Calo-me a mim mesmo, e fujo para a casa dela a alguns quilómetros dali, para onde a conduzo com a sua nádega direita bem apertada pela minha mão direita, pois faço-a circular na parte interna do passeio, protegendo-a de um potencial carro em contramão. Por alturas da Studiestraede, lembro-me de lhe lembrar a que sabe a minha boca, e com a sua língua presa na minha, percebo por fim porque me odeio. Para destruir há que construir, não se destrói o que não existe. O prazer da minha edificação de mim mesmo, era apenas para me corromper no final. Que filha de putice. É que andei a perder tempo longe daqui.
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A postura dela ia-se alterando gradualmente, olhar cada vez mais fatalista e carregado de despeito para com a ‘vida’, essa coisa ininteligível que tratamos por ‘tu’ por acharmos que temos alguma posse sobre o nosso corpo, pensamentos e mundo que nos rodeia. Eu já sabia o suficiente para perceber que a ruptura ainda não ocorrera, mas a carta de despedida já vinha pelo correio. Estas são as melhores ocasiões para perceber como a marioneta humana, é realmente. Se andou anos contigo a fingir ser aquilo que achava que querias, se de facto gostava de ti. É melhor que a prova do algodão numa caldeira a carvão. Por detrás dos jantares em família, das consecutivas caras de enjoo, de descontentamento com a posse do prémio de consolação, da postura de frete, do diálogo interior levado para tons morais de forma que o indíviduo se sinta bom (a), para mais tarde não se arrepender das acções cometidas, já eu percebia a fatalidade e comicidade da situação. A traição, adultério, com alguém em concreto, é algo de difícil, mas compreensível, se entendermos que todos os sujeitos carregam diferentes parcelas de defeitos, encantos e idiossincrasias que nos levam a afastar ou querer aproximar deles. Como se dizia na tropa «-Mais vale cair em graça, que ser engraçado.» - e é um pouco isto. Tal como sabemos que os favores condicionais de uma fêmea estão dependentes da capacidade da nossa personalidade em providenciar essa dose de incerteza e entretenimento, sabemos igualmente que outro pode vir e roubar a atenção da ‘nossa’ parceira. Espera, tive de me rir até ao choro, com esta palavra, ‘parceira’. Adiante. É fácil perceber que alguém nos queira trocar por outro que tenha mais brilho. Isto casa bem com a falta de auto-estima que temos em nós próprios, com a vergonha interiorizada que todos temos de achar que existe pelo menos um x que não é normal por comparação com outros habitantes do planeta, e por fim, pelo facto de que todos sem excepção, exageramos na percepção dos nossos defeitos, o que se torna um sério problema quando divinizamos as mulheres e a sua suposta ‘intuição’. Achamos sempre que elas conseguem cheirar a léguas as falhas do nosso ser. Outra coisa totalmente diferente, mais penosa e sinistra, é quando a ‘parceira’… Espera, outra sessão de riso. Adiante. Quando a ‘parceira’, anseia, por outro alguém indefinido, apenas que não sejas tu. É um pouco «-Qualquer um serve desde que seja melhor que tu.» Isto é duplamente perturbador. Por um lado, a rejeição sistemática de todas as qualidades, e defeitos, que te fazem atraente, e que se tornam repelentes. Como é uma contradição lógica, o tipo nesta situação não tem como não tomar isto de forma pessoal. Ou seja, sou rejeitado, APESAR, das coisas boas que sou, tenho ou faço. O que só acentua a rejeição. Mas o lado mais insidioso, é o de ela desejar um outro indefinido, que ainda não apareceu. Isso é mau para ti ou para o que vier a seguir, se tiver pouco calo, ou se se permitir gostar dela. Ele vai ser desejado não pelas suas qualidades, mas pela sua novidade, pelo contributo que dá ao facto de ela não conseguir viver consigo mesma, sem um homem que a distraia para o facto de ela ser quem é. Tu e o próximo, pelo menos enquanto durar o período de ‘fascínio’, são soldados a prazo. Quando dormem noites seguidas na mesma cama, sentes a presença dos homens que ela realmente deseja, mas que ou a rejeitaram, não se proporcionaram, ou com quem só efabula, seja pelos media, pelas conversas das amigas, ou pela sua pequenez de espírito. Estes homens, existentes ou fantasiados, correspondem no fundo, a fases do desenvolvimento da sua personalidade, do que acha e determina (pensa ela que autonomamente) os critérios com que avalia um humano (nova sessão de riso), do sexo oposto. Como se ela, tu sabes a quem me refiro, fosse capaz de te ver como ‘humano’. És um antropóide, a meio caminho entre um animal e uma máquina. Daquelas em que largamos água salgada ou lágrimas pela ranhura das moedas, para libertar por curto-circuito, bebidas doces. Tu, o não desejado. O outro, o desejado, esse está a meio caminho entre um deus, e um prémio de lotaria, com que a ‘vida’ a presenteia, por ser quem é. Um ser humano com grau variável de simetria facial, e um buraco de onde saem orgasmos e crianças. Quantas vezes não te agarras ao lençol, sob terrores nocturnos, e pedes a Orfeu que te deixe entrar no sonho dela e perceber a charada de que só suspeitas, de que és o homem da vida dela por enquanto, e outros são os homens dos seus sonhos? Tu próprio sabes a resposta, e sabes que nada tem que ver com a gaja, mas contigo, pela tua crença interior de que só por favor pode alguma gaja gostar de ti, e, portanto, andas sempre a olhar para o chão à procura de sombras que te ameaçam. Dás murros na parede por não conseguir escapar a essa espiral regressiva, composta de mentira social, e incapacidade tua de acreditar no que não ousas dizer alto, que és incomparável, irresistível, mas incapaz de acreditar em ti. Quantas vezes não olhaste para os números vermelhos do ardente despertador até que o dia nascente começasse a confirmar que não estavas no Inferno, preso a um demónio criado para te fazer sentir mal por seres quem és? Com as negas de sexo, ou com sexo sem desejo, que passas a tomar como norma para todos os homens deste mundo. Todos os que definham em relações onde não são desejados, acham inacreditável que outros sejam desejados de forma absoluta e carnal, pois não são as relações entre homens e mulheres, ampulhetas rápidas até a uma monotonia com que se aprende a viver? Vais continuando preso a ela, porque achas que não consegues arranjar melhor, porque te afeiçoaste a ela, e porque a tua ética to impede, mesmo quando lhe encontras fotos num livro que te emprestou, dela em orgias há 10 anos atrás. Mais do que pairar a sombra da sua intencionalidade ao emprestar o livro com essas fotos, o contraste entre a pessoa, que não te larga, mas também não te fode com tesão arrebatadora. A tua lógica fraqueja e dissolves-te no lodo da uma morte prematura. |
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