Miguel chegara no Alfa Pendular das três da tarde. «-Tão pá, como estás?» foi o que disse sob o seu sorriso largo mas controlado. Meia hora depois estávamos a jantar no Cais do Sodré. Às 4 da tarde. Sempre o Cais, do, Sodré, donde Lisboa toda irradia a partir da nesga de rio. Os melhores vinhos e antes de acabarem as azeitonas, já Baco se sentara connosco à mesa trazendo os templos de putas e vinho verde. «-Continuas a acumular troféus?» perguntei eu, rompendo a neutralidade da ocasião e a naturalidade com, que eu sei, ele não fala neste tipo de assuntos. Miguel é um dos estudiosos do tema, um dos melhores, ou pelo menos, com uma compreensão mais profunda do que está em jogo, e de como se encaixam os processos. Meia hora a falar com ele, deixa-me com um mês de adequação das minhas crenças anteriores, boa parte delas. É tão observador quanto não gosta de trazer à luz da articulação o tema. Diz que a melhor maneira de olhar o Sol é não olhar directamente para ele. Tem razão, podemos ver o disco solar, anónimo e abstracto, pagando com a nossa visão momentaneamente, ou para sempre. Ninguém quer passar o jogo a tratado geométrico. Só os que não sabem ou conseguem jogar. «-Nada de significativo. Quem vê o que está por detrás da cortina, passa de um momento para o outro a ver sempre a mesma peça representada ou filme exibido, repetidos ad nauseam. Perante isso resta, para não se morrer de tédio, procurar pormenores não vistos antes, ou padrões ainda não pressentidos. Assim que se tenta articular algo sob uma lei geral, vem o mundo furar ao lado da nossa teoria.» «-Pois, também prefiro a análise à entrega. Será leite amargado?» ironizei eu, mais perdido no que ele dissera que no desabafo que automaticamente saiu de mim. «-Não vejo como uma questão de amargura mas de logística. Um coração só pode desfazer-se um certo número de vezes. Sem adesão emocional a única forma de continuar a jogar é olhar para as estruturas da casa em ruína. Sem adesão emocional o jogo perde o que nos faz jogar, o relativismo grassa, tornamo-nos mais atraentes pelo desapego, mas a alma está ferida de morte pela descrença. Só quando o corpo consegue o que quer, perde a alma o que procurava. E que sempre esteve em si. Quando percebemos a ingenuidade das nossas crenças anteriores, sucumbimos sob a falta de confiança em nós na nossa capacidade de análise, o ser mirra e entramos no mosteiro do asilo em terra incógnita até que a mãe Morte nos venha buscar.» «-Estás muito poético.» «-A poesia tem uma forma de resumir muito interessante. Dispensa tratados de explicação. Apanhas ou não apanhas, se não apanhas, apanhasses.» «-Como te está a correr o trabalho?» desviei eu de assunto incomodado com a fuga dele à minha intenção de obter o tratado do engate, de forma a melhorar a minha própria técnica. Ele percebendo, vira-se para aforismos, nunca dando uma resposta escorreita. Ou porque me topa, ou porque não sabe articular de outra forma. Saber de duas formas, sabemos como decoramos uma fórmula, ou sabemos a partir da memória muscular, em que sabemos a partir de algo muitas vezes repetido que se torna instintivo. Algo que não deixa a parte emocional tocar com as suas patas gordurosas. «-Bem, barcos vendem-se bem, quem tem dinheiro não se inibe de o gastar neste tipo de bens.» Como quem não está à espera, lembrei-me da situação de Custódio e do nome da empresa onde a mulher em breve, ex, trabalha. Uma associação livre que não sei porque me ocorreu. Talvez instinto, intuição. «-Como se chama a empresa onde trabalhas?» «-Ramos e Irmãos Leisure Lda.» Raios. Era a empresa onde trabalha a futura ex esposa de um outro meu amigo, Custódio. Perguntei se conhecia alguém com as características, que ela tinha, descrevendo-a. «-Sim, andei a comer essa tipa.» Ponderei demoradamente sobre se o colocaria ao corrente do que se passava. Eram ambos meus amigos. «-Essa mulher é esposa de um amigo meu.» Ele parou e olhou seriamente para mim. «-É? Não sabia. De quem?» «-De outro amigo do Porto que conheço desde a tropa. Não conheces.» Pareceu superar a afecção, despejando mais um copo de vinho e acendendo mais uma cigarrilha. Olhando o horizonte, parecia distrair os olhos, enquanto a cara exprimia mais uma confirmação da velha piada sobre uma existência agónica onde os seres e as equações se entrecruzam. «-Ele está destroçado. Foste-te meter com a mulher dele.» Ignorou por completo o meu tom de censura. Nunca lhe passaria pela cabeça explicar-se, mas também nunca lhe passou pela cabeça que o chamasse à atenção. Olhando para mim, de certa forma fingindo surpresa gasta perguntou «-E?» «-Nada. De certa forma fizeste-lhe um favor, foi o que lhe disse.» «-Essa tipa se não o fizesse comigo faria com outro. Eu não ligo a isso. Até te digo mais, depois de mim, já se enrolou com mais dois. Já tive esses pudores. Agora não.» «-Então?» «-Mano, eles são piores que elas, elas traem-nos e eles vêm ter comigo como se eu fosse o que as desencaminha, quando é algo que já estava no íntimo da pessoa que eles reduziam a meninas virginais negando-lhes o direito de serem madonas infernais. Esses mesmos bocós, que quando eu tinha esses pudores, saiam comigo para os bares e aproveitavam eu ir mijar ou pedir outra rodada, para se fazerem às minhas companhias nas minhas costas. Não. Já não tenho esses pudores.» «-Sim, eu entendo, que se uma pessoa não está satisfeita, tem todo o direito de procurar quem a faça feliz. Faz-me confusão como tratam um gajo depois de já não o quererem, isso sim, faz-me confusão. O resto não.» «-Não penses nisso, resolves o problema.» «-O meu anjo da morte já me disse isso.» «-Hã?» «-Esquece. Eu sei que tens razão. Não se pode esperar o respeito das mesmas regras por parte de quem joga um jogo diferente.» «-Esta era fácil de interpretar. Aos quarentas e poucos sentia-se apartada de uma vida mais excitante que achara merecer por direito. O tipo em casa não apresentava senão a excitação de um bom e velho relógio de cuco, que a intervalos certos a penetra ruidosamente. As mulheres são seres inteligentes, normalmente mais facilmente enfadáveis que nós. A maior parte dos gajos tenta ser divertido para aplacar essa neotenia. O que é o mais enfadonho ainda. Não pensar, resolve o problema. Borrifar. Quando se interessa por nós vende-se uma imagem a ela, diferente da que quer largar, e próxima do que acha merecer.» «-Essa merda parece física nuclear.» brinquei eu, ainda perdido nas palavras, guardadas longamente, mas que ele soltava como que por expiação de um qualquer pecado, ou alívio de silêncio constrangido. «-É mais complexo ainda. São bichos que funcionam na imagem, na percepção, controlas a percepção, controlas a forma como pensa. Controlas o pensamento, dispões do corpo. Boa parte dos bananas acham que é por revelarem como sentem e serem mais como mulheres, que criam essa ponte de identidade com a tipa que querem desposar.É lógico e soa bem, mas infelizmente não funciona assim. Os seres lutam pelo privilégio reprodutivo, mal estará o mundo quando o desejo se erigir por decreto. Os bananas correm para um relacionamento para disporem de vulva de forma segura e regular, olham para as gajas como a dose narcótica que acalma os demónios de inadequação e a necessidade de vulva e dedicação exclusiva a um parceiro. Eu vejo-as como barro humano com os defeitos de fabrico que todos temos. Esse teu amigo devia achar que tinha encontrado resposta para o dilema reprodutivo, mas esqueceu-se que ela também é feita de espírito.» «-Sim, mas não podes negar que a forma de avaliação delas é cruel, como se fôssemos objectos no seu plano.» «-É igual à nossa. A única diferença é que o fascínio é directamente pelo corpo delas, que é mais elas, que o dinheiro e a dominância são nossos. Ou talvez não, o gajo com meios e dominante, é o dono da sua capacidade de dinheiro e dominância, tal como ela é responsável por ter nascido bonita. A beleza promete imortalidade, e os meios visam garantir a imortalidade dos futuros nascidos, pois para criar crianças é preciso meios. O homem de meios mostra que tem recursos para ser pai e vencer o dilema reprodutivo.» «-O tipo está destroçado.» «-Está porque é um cobarde, no fundo. Investiu a sua imagem e a sua responsabilidade pessoal ante a eternidade, num centro de gravidade fora de si, só porque não é senhor nem do seu espírito nem do seu corpo. É mais fácil abdicar de si em prol de um outro, que como última peça do puzzle nos dará o placebo de sentido na vida. A haver, são os filhos que já tem, o resto é acessório. Elas pensam assim, e as que não pensam, dependem do seu valor de mercado, ou seja de saberem quão fácil para elas é substituir aquele que já não serve. As pessoas usam-se umas às outras, nos seus planos e vidas secretas que só elas acham saber. Só porque pensam fechadas dentro da sua cabeça acham que os outros não terão algum acesso a esse mundo unívoco, mas enganam-se, eu por exemplo, pareço um carneiro mal morto e distraído mas estou sempre a analisar, a tentar perceber o que pensa e porque pensa o outro, o quer que seja que pensa.» «-Mas nada concluis que tu próprio já lá não tenhas colocado. Projecções.» Ele riu-se. «-Tens razão, por isso não penso. Vejo, planeio, executo. Quero determinado corpo, manipulo determinada alma. Esse teu amigo é porreiro?» «-É o sal da terra.» «-Ainda bem, fiz-lhe um favor. A mulher dele está em queda livre. Baixa auto estima camuflada sob peças de roupa bem arrumada sobre a pele, mas a crença profunda de que no fundo no fundo, sabe não prestar. Finge para o mundo, em especial para a família, algo que sabe não ser, porque sabe que não é. Não presta, não porque não preste, não presta porque nessa pantomina, oblitera tudo e todos para manter a aparência, para manter o olhar que vê nos outros, que a validam como ela quer ser vista. Tal como os conas que precisam de elogios femininos e de engatar gajas, para se sentirem apreciados, válidos, adequados através dos olhos de outros, de maneira que não conseguem fazer a si mesmos. Um pouco como alguém que comendo a sopa só sabe a que ela sabe através da boca de outro.» «-Como tu?» «-Eheheh cabrão! Por acaso um pouco, mas estou a trabalhar nisso. Uma vez que acertei com o método, relativizei o alvo e acalmei bastante. Não as deixar como deusas.» Levando-o de volta para o comboio, e depois do breve abraço de camaradagem, extemporaneamente me disse, «-O teu amigo tem sorte. Livrei-o de um problema que tinha.» «Eu sei.» disse eu enquanto me afastava da carruagem branca e gotejada pela chuva. Voltando para casa olhei a Lua e ela sorrindo perguntou-me se eu queria mais ou ia chorar como um puto maricas e pedir para voltar para dentro do saco preto. Ri-me com o riso mais amargo, por saber que lá por parte do mar me abranger a pequena praia do pensamento, nem por isso eu sonhava saber o que é saber navegar.
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O Custódio veio de propósito de Gaia para tomar café comigo.
Como estás, já gostas de gajas e essas merdas em que na brincadeira os gajos aferem o estado emocional uns dos outros. A diferença entre isso e bullying, é que as provocações não visam enfraquecer ou menorizar, somente provocar resposta, eco do espírito do outro que revela assim estar pronto a ripostar, num combate de mordacidade cerimonial. O abusador, canibaliza outros assim, lê as suas fraquezas e usa-las para controlar e estocar o outro. O homem normal, digno desse adjectivo, testa o outro, para saber a sanidade de espírito do parceiro de tribo. «-Ó paneleiro, como vão as tuas pilas.» não é um insulto à homossexualidade do outro, mas um ping que pretende obter uma resposta, para saber se o host está presente. Se o outro é ou não paneleiro não interessa numa amizade verdadeira. Nem sequer surge. Em vez disso, «-Então malandro, já tiraste férias das férias? Quando é que começas a trabalhar uma vez na vida?» - ou algo semelhante. O objectivo não é o estoque. É uma palmada nas costas com palavras, a ver se o saco de ossos que é o outro, está apto para ir caçar o mamute. O riso amarelo dele disse-me que algo estava mal. Está tudo bem, que contas. «-João, estou-me a separar da Marisa.» «-A sério? Epá, lamento imenso saber. Que posso fazer para vos ajudar?» «-Nada.» Fiquei descolhoado porque tive um papel directamente ligado ao casamento dos dois. Há 20 e tal anos a bordo de um vaso de guerra da Marinha de Guerra Portuguesa, o condutor de máquinas Custódio, sabendo da minha relativa facilidade de articulação de poesia lírica e literatura, pediu-me ajuda para engatar uma vizinha, que micava havia muito tempo, mas nunca tinha tido muita lata de abordar. Como se chama ela? Marisa. Marisa, Marisa…Marisa brisa do mar. Fiz um poema de duas páginas com a descrição que ele me dava dela, trejeitos e tudo, e o que não sabia, inventei baseado em gajas que eu próprio queria facturar. Parece que o poema surtiu efeito, pois ambos casaram. Na altura não pude ir ao casamento, estava embarcado, e antes de sair de Alcântara, Custódio veio à minha presença descolhoado, que ela se calhar só gostava dele pelo poema, que se ia desinteressar dele assim que descobrisse que só lia Tom Clancy e nada de lírica galaico-portuguesa medieval. «-Foda-se Custódio, estás a gozar comigo?» -«Não…porquê?» responde ele com aquele sotaque carregado duriense. «-Foda-se achas que ela leu? E se leu não compreendeu um caralho. As gajas são como gralhas, gostam de coisas brilhantes, mesmo que pechisbeques.» Ele olhou-me como se eu fosse um cabrão saído de uma taberna numa caverna. O engraçado é que para dar conselho nas vidas dos outros sou exímio. Mas qualquer cachopa que se finja interessada em mim, e logo a idealizo a par com Ishtar. «-João, eu não vejo as mulheres assim, quem te magoou?» «-Ninguém, todas, eu. Esquece. Não penses essas merdas de ti. Ela não é um ser humano melhor que tu. Tem algo que tu não tens, a possibilidade de transmitir vida no seu corpo, apenas, nada mais, nada menos. Não dependas dela para te sentires melhor, nem a coloques num cabrão de um pedestal. Essa merda é alienação e vais-te foder com isso. Falo porque já passei por semelhante.» «-Eu sei, por isso vim falar contigo.» Isto há 20 e tal anos. Estava a bordo, com a cor da relva de bater com a cabeça numa viga de ferro sob a minha cama e travesseiro, com ondulação de 7 metros e no encalço de um veleiro de alemães à deriva, quando o helicóptero trouxe a correspondência, e numa carta para mim, a foto do casal numa igreja lá para o Norte. Todos os natais recebia a chamada dele desejando-me boas festas, que isto os homens do Norte quando são a sério, são amigos para toda a vida. Quando os filhos nasceram, também soube em primeira mão, recebendo o testemunho daguerreótipo da obra feita e previamente o ecograma. Fui aos dois baptizados. O tipo que estava agora à minha frente não era o mesmo. As costas largas e o sorriso confiante eram pálidas memórias. Encurvado e reduzido na sua dignidade por anos de descolhoamento e desdizer dela, ressentida com a sua natureza plácida e que evitava dramas e desperdício emocional desnecessário. Anos a fio a desprezar um tipo que não tinha em si, grande acervo de acessos de raiva, e com o qual se ressentia por confundir isso com falta de espinha perante as merdas – que ela própria reconhecia como tais – que lhe dizia. Testando e minando o seu feitio pouco dado a palavras, estóico. Odiando-o por ele dela não se defender, antes a evitando, tentando aplacar e com isso só aumentar o despeito que ela sentia por ele. Pelo que me contou, ela mudou de emprego, e um colega coleccionador de troféus, começou a dar em cima dela, primeiro com conversas moles que ele apanhou no telemóvel, depois com fotos clichés de copos de vinho à lareira e elogios fáceis em forma de bolos que levam os tolos. É tão fácil cair no elogio. Frases motivacionais de merda nas redes sociais. A ‘inadvertida’ interacção no whatsapp supostamente por engano. A favor da ‘cordialidade’ ela sempre foi dando conversa, observando-a na pornografia do seu olhar encoberto, quando passava pelo seu cubículo com a autoritas hierárquica que a sua função conferia. Como a ela, outras igualmente impressionáveis haviam caído no laço. Era um coleccionador, comia e a sucessão de digestões levara-o a desenvolver uma pena pelas tipas que largava findo a conquista do troféu. Tornara o largar, uma arte. Que algo não estava bem, que era ele. O seu maior aliado era o ego delas, que justificaria sempre o passo em falso que davam, isto se havia algo em jogo que haviam perdido. Quando eram solteiras e com anos de valor sexual pela frente, não havia problema. A insegurança dela e o sentimento de que podia sempre arranjar melhor que a ruína do homem anterior que se desfizera em noites mal dormidas por causa do trabalho, para meter comida na mesa e bens de prestígio com que mostramos uns aos outros que sabemos o que é viver e que somos bem-sucedidos no esboço de jogo que achamos que a vida é. Eu não a conhecia bem, fora das ocasiões sociais, em que sempre me tratava com desconfiança e hostilidade latente, em comum com todos os amigos dele, que de ano para ano iam sendo sempre menos, até que por fim, só sobrava eu e mais um ou outro, e ela era dona suprema do seu mundo. Mas pelo que via, e ele me deixava perceber, era uma tipa terra-a-terra, cujo mundo é aquele que lhe aparece à frente dos olhos e sob o tacto das mãos, tudo o resto inefável era por ela visto como fantasia de gente fraca. Era uma tipa desinteressante e com aspecto mediano, valendo ser alta e arranjar-se, exímia no rimmel que fazia como poucas, fazer sobressair os olhos azuis. Mas como gaja, e como os homens são na maior parte bocós, quando começou a ter mais atenção e validação, achou que merecia o melhor que a vida tem para oferecer, na figura de gajos que lhe elevassem o valor social, e que ao entrar no café, as amigas cochichassem entre si, que belo gajo que ela arranjou, é porque existe um quid qualquer nela, e esse quid é a medida da individuação que um gajo ‘normal’ e seco por anos de sacrifício – a quem ninguém o obrigou senão ele – no trabalho. O grupo de amigas, ou solteiras ou adúlteras, contribuía para reforço da fantasia, tu mereces princesa, mereces ser feliz. Ele não vai a lado nenhum, já tens os filhos, se não estás feliz tens de ser tu a ir procurar a tua felicidade. A mensagem passa incólume quando os filmes e anúncios comerciais passam esta ideia de um menor valor do homem, e de que por ser mulher a mulher tudo merece, por supostos séculos de opressão, ou girl power, o que seja. No fundo, as amigas queriam isolá-la dele, para a terem mais tempo consigo, alinhar nos planos em comum. As solteiras porque ela lhes lembrava que a sua relação de 20 anos era um sucesso comparado com os 8 meses que conseguiam manter um gajo. As casadas, porque não gostando do marido, não podiam fazer programas a quatro com um gajo, o Custódio, que era um tipo que apesar de tudo, tinha algum discernimento das coisas e portanto seria má influência para os domesticados maridos delas. Escreveu-se um amor no céu, portanto. «-Custódio, tu tinhas consciência do jogo. Não te faças de ingénuo.» «-Hã? Como assim?» «-Eu via a tua compostura, e como reagias às minhas tretas sociológicas. Tu achavas que tinhas resolvido o problema da reprodução e que por teres gaja, tinhas o problema ou essa área da tua vida resolvida. Como ela até era vistosa, cheguei a ver-te com algum desdém por todos os que conhecias e que eram solteiros, como se a validação social de ter uma gaja fútil na ponta do braço, traga algum valor para um homem que se considere como tal.» «-Não concordo com isso se bem percebo. Era a minha melhor, apenas e só.» «-Mas qual tua, foi só a tua vez. Ninguém é de ninguém. O mito da alma gémea é o mito que visa colocar o homem na dúvida se deve ser íntegro ou não. Ela escreveu-te algum poema?» «-Não, que tem isso a ver?» «-Achas que a pilinha vale menos que o pipi?» «-Não, mas é suposto o homem andar atrás de mulheres…» «-Vai dizer isso ao colega de trabalho da tua futura ex-mulher. Todos os homens perseguem gajas. Mas nos tempos que correm, temos de ser coerentes com o ‘conceito’ de igualdade. Se não me perseguem a mim, também não as persigo a elas. Porque é suposto dares-lhe poemas e rosas e perfumes, e a prenda dela é a sua companhia? É a mulher algum prémio que seja celeste só porque existe? É a mulher feita de um barro diferente que mereça adoração ou deferência? Não fossem estes conas todos que as perseguem e validam só com a ténue esperança de um pouco de punani e o apreensão que elas tinham do mercado da carne, seria diferente. Mas a maior parte gosta de viver em submissão, e como vê todos os outros fazer o mesmo, age de igual forma, aceitando que é melhor perder o respeito próprio, cedendo nos seus limites, que passar uma semana sem pinar uma tipa que não tem a inclinação a não ser o desfastio de estar com eles, ou que os pretende manipular entretanto.» «-Quem te magoou? Eu não consigo falar assim das mulheres, não vejo assim!?» «-Porque é que uma opinião considerada negativa só pode emergir do trauma? Ninguém me magoou, só eu pá. Diz-me, ela teve alguma conversa contigo a dizer que queria acabar o casamento?» «-Teve, disse-me uma datas de coisas que eu tinha feito mal. E que achava que já nada sentia por mim.» «-Essas coisas que ela apontou, podem ser ditas igualmente dela?» «-Podem, também deixou de investir em nós, eu por vezes também nem a podia ver. Só permaneci por causa de ela ser a minha mulher, a minha família.» «-Essas coisas que ela te disse não foram senão desculpas arranjadas depois da decisão tomada. Ela já tinha decidido que ia pinar o gajo das vendas, na empresa de venda de barcos onde ela trabalha, e que foste tu que arranjaste para ela. Esses erros que disse que cometeste, foi a forma que arranjou para justificar para si mesma, a decisão primal e básica de ir para a cama com o gajo mais excitante e novidade.» «-Epá, mas as mulheres têm direito a foder quem querem, tal como nós.» «-Amigo, a nível de direitos, têm sim senhor, sou o primeiro a defender que fodam quem quiserem, e que prefiro comer meia tonelada de iscas cruas fora do prazo, que ter uma gaja ao meu lado que me fode apenas por dever matrimonial. Mas também não se podem queixar se não as respeitamos por estes supostos assomos de emoção em lógica de merceeiro. Qualquer gajo que não esteja hipnotizado pela vulva sabe que uma gaja que larga outro por ele, eventualmente lhe fará o mesmo. Portanto este tipo de gajedo é como o pão alentejano, come-se bem nas primeiras duas semanas, depois o bolor é um perigo de saúde pública.» «-Não gosto que fales assim, reificando as mulheres.» «-Para já fui eu que te ensinei essa palavra, não me venhas com ela. E reificar, reificam elas também, ou achas que colocando fotos do seu corpo no instagram e fakebooks, não estão a mostrar a mercadoria a futuros clientes que escolherão de acordo com o que mais lhes convém e cujo vínculo afectivo será racionalizado A POSTERIORI, hein?» «-Pois, usamo-nos todos uns aos outros. Eu não quero viver assim.» «-Criaste uma fantasia na tua cabeça e identificaste-te com ela. Queres que seja real. Há muito do teu ego que morre, se ela desaparecer. Tens o teu ego investido na missão familiar que deu sentido à tua vida, durante muito tempo. Por isso não queres largar. Vê lá se ela hesitou entre desfazer uma relação de muitos anos contigo, pela possibilidade remota de romance. De um certo ponto isso mostra que significavas menos para ela que o risco de te perder. Na sua cabeça convenceu-se de que era o melhor para ela, e decidiu de acordo. Os homens é que são uns conas embevecidos por este idealismo palerma. Há 50 anos eram chamados para a guerra e a última coisa que lhes passava pela ideia era agradar a esta ou aquela mulher. Protegiam a tribo, ponto. Se aparecessem gajas seria coincidência, não o seu foco de acção.» «-Estou a sofrer muito com a falta dela.» «-Esquece-a, porque ela já te esqueceu a ti. Nem é a ti que ela esqueceu, mas ao valor de utensílio que tiveste alguma vez. Elas não escrevem poemas, e se não correspondem com o mesmo grau de idealidade que tu, nada podes fazer senão pagar na mesma moeda. Se como diz Camus, não há destino merdoso que não se transcenda com desprezo, despreza todas essas tolinhas hipergâmicas que se ofendem de ser avaliadas pelo corpo, mas que avaliam pelo bolso. Se aparecer uma diferente, que as há, tu é que ficas a ganhar. Existem mulheres que amam perdidamente e verdadeiramente um homem. Matematicamente é inegável. Mas são cada vez menos. Pensa, se tivesses ministérios de propaganda em filmes, anúncios e cartazes lá fora na rua a dizer que o homem é a maravilha da Criação, e que as mulheres são todas tolas adoráveis, até que ponto não interiorizarias essa ideia nas tuas interacções com gajas? Animais de rebanho somos, reflectimos uma espécie de mentalidade de grupo. Elas como nós. Se te convencessem que merecias o pó cósmico em torno dos anéis de Saturno, alguma vez verias a beleza de um remoinho de pó na beira da Estrada de Sintra? Tal como convencem a elas que merecem apenas, um gajo bonito e excitante, mesmo que elas sejam mais monótonas que uma buzina no trânsito, ou feias que o respectivo camião. Pouca gente assume que a maior parte da população é monótona, chata, pouco individuada. Não variamos muito assim uns dos outros. Procuramos gente excitante para nos vender à liberdade, porque nós próprios nos prendemos. Só procura gente excitante, aquele ou aquela que não o é por si. É uma luta que não consegues vencer. Olha, dizia o Foucault a Chomsky, é mais produtivo encontrar formas de libertação que enumerar as de opressão. Considera esta ruptura como uma segunda oportunidade, onde tens algo a ganhar.» «-A ganhar, estou a sofrer tanto. Não vejo ganhar nenhum nisso.» «-Ganhas a dobrar, livras-te de quem não te quer, e o desgosto te fará uma pessoa melhor. As tipas que borboleteiam de gajo para gajo, só matam o vazio, com a novidade. Nunca ou só raramente, fazem obras na sua casa psíquica. Há sempre um novo rol de gajos no horizonte, onde se podem distrair. Esquecer o que correu mal e lixiviar sonhos. Os gajos, especialmente os mornos e remediados, passam longos períodos sem parceira, com amplo tempo para reformularem e analisarem as suas personalidades. Qualquer mulher com dois palmos de cara sabe que existe um séquito de tipos em standby, que orbitam em seu torno, à espera de uma zanga dela com o actual. A ruptura para elas raramente implica crises existenciais prolongadas, porque há sempre uma nova dose de oxitocina alinhada em fila, há sempre abundância de pretendentes.» Custódio escutava as palavras mas não as ouvia. O que sentia sobrepujava qualquer exercício de racionalização, que em graduais espirais cada vez mais abstractas, desliga o ouvinte da realidade concreta sob que se debruça, denotando o narrador com lunático perdido nas nuvens de Aristófanes. Já sei, explico demais. Já sei. E ao falar muito, baixo o valor da mensagem, e portanto, o quer que eu dissesse a Custódio não o ajudaria, como ajuda a mim, entender os outros e os processos onde se relacionam. «-Custódio, retém só isto. O sofrimento interior que sentimos, é um passo mais na escada espiritual. Elas pouco aprendem, primeiro porque nunca sentem o impacto da solidão e da rejeição, como nós, e vão perdendo gradualmente a capacidade de se ligarem a alguém, pois existe um decrescer da oxitocina com a idade e com os relacionamentos. O preço pago por nós, é o de sermos o sexo dispensável. A contrapartida que a Natureza parece dar-nos, é uma evolução espiritual mais prolongada. O que pode ser castigo. Um gajo ruminar até ser velho sobre os desgostos de amor que sentiu. O que só confirma o velho adágio…o homem torna-se, a mulher é.» «-Achas que devo fazer algo, ir ter com ela, suplicar-lhe, acariciá-la, forçar um beijo?» «-A mulher é um ser com agência, e de igual responsabilidade ao homem. Achares que convences ou trazes ao sério, é um atestado de menoridade que passas à gaja. Mas pensa, queres que alguém esteja contigo, porque a convenceste a estar?» «-Não, tudo menos isso.» «Boa, ainda tens amor próprio não ardido no altar dela. Eu já vi mulheres atrás de maridos adúlteros com os filhos na mão, para ‘sensibilizar’ o tresloucado. Já vi homens fazer o mesmo, batendo nas janelas embaciadas do carro onde a mulher se enrolava com outro. Instrumentalizando as crianças, numa lógica compreensível, mas bacoca de trazer à razão. Deixa-las com as consequências das suas acções e escolhas. Segue em frente. Nada mais podes fazer. Mercê da sua falta de crises existenciais agudas, falta-lhes regra geral, autocritica racional e introspecção. Portanto justificarão como mitómano, todas as decisões que tomaram, e viverão felizes com essas narrativas que elaboram. Resta-te agradecer a ela, por ter tomado o passo que não conseguias tomar, em tantos anos de casamento, onde um pelo menos não era feliz.» Ao olhar para Custódio, vi que olhava para o chão, de forma a que as lágrimas escorressem melhor. Não posso ver ninguém chorar, abracei-o e disse que lamentava o que estava a sentir. Toca o telemóvel. Ela quer falar com ele. Ele despede-se sai disparado e que depois me liga. Peço no balcão para me reencherem o copo de brandy. Ao brincar com a língua e um cubo de gelo, toca o meu, é Miguel, dizendo que vem a Lisboa na próxima terça-feira, para irmos almoçar. Tenho amigos na zona do Grande Porto, Minho e Trás-os-Montes. Quando passam por cá, é dia de almoçarada ou jantarada. Miguel é vendedor numa empresa de venda de barcos. As mãos enrugadas e no escuro das luzes vermelhas, viravam cartas entre ossos, que veterinariamente não consegui identificar. A senhora vidente, inalando pequenas doses de enxofre, sem me olhar e sem me ter dito uma única palavra desde que entrei na tenda marginal na feira medieval de Aljezur, mostra a palma da mão olhando para a direcção do solo com olhos fechados.
«-João, tu já reencarnaste 11 vezes. Estás na tua última, estás ainda aqui só para fazer o balanço das tuas vidas passadas. Depois desta mudas de plano. Não é preciso entrares em desespero, o pior já passou, mas este último desafio também não é fácil. A sua dificuldade está na sua estranheza.» «-Que plano?» retorqui eu. «-Não interessa. Não te mates, isso é o mais importante.» Pensei para mim, matar? Nem me passou pela cabeça, se bem que há uns poucos anos atrás, me via sem saída de uma má situação que felizmente se veio a resolver sem eu nada fazer. Não acredito em ocultismos, valeu pela experiência. Já a caminho da A2 achei o ralenti do carro demasiado acelerado, parei na berma da estrada, acendi um pequeno holofote led sob o possante motor de dois mil centímetros cúbicos, e rodando o parafuso que regula o ralentim do carro em sintonia com a válvula termoestática, reduzi a aceleração até soar bem ao meu ouvido. Quando me preparava para baixar o capot, o carro desliga-se em simultâneo com um relâmpago sem trovão, e sem nuvens no céu. Não percebi o que se passara, o céu estava rosa e o Sol já só mostrava o rabo mergulhando a Ocidente. Vi perifericamente um vulto encostado à porta do condutor do carro, e baixei o capot por isso. Devia ter uns 230 centímetros de altura, coberto andrajosamente da cabeça aos pés por um grosso capote de lã cinzenta cinza de crematório. Não tinha rosto, apenas um abismo negro no lugar da cara. Atrás do carro, uns 2 metros, uma mesa de piquenique e dois bancos corridos, que não me lembro ver ali…piquenique? Na beira da estrada? A voz afiada diz «-João, estou aqui para falar contigo.» «-Quem és tu?» perguntei eu. «-Sou o teu anjo da morte. Senta-te 10 minutos ali na mesa comigo, desapareço já.» «-Meu anjo da quê?» A figura desfocada não me permitia ver a direito e a minha própria vontade entrara em piloto automático como se eu não fosse dela dono. O meu medo levou a melhor sobre mim e corro para me sentar dentro do carro, rodando a chave e nada. Digo em voz alta «-Merda para o motor de arranque. Deve ser escovas.» Olho para trás pela película preta comprada no chinês, que cobre os vidros do Toyota comercial de dois lugares, e vejo o vulto imóvel na mesa, esperando por mim. Algo de racional me fazia ter vergonha do meu medo e associar de alguma maneira a avaria mecânica ao cara de abismo que me falara antes. Saio porta fora e sento-me defronte do tipo. Ou tipa. Não conseguia identificar. Assim que me sento começa a falar. «-João cometeste sacrilégio em relação à tua vida.» «-Já sei, desperdicei tempo com gente que não merecia.» «-Não. Desesperaste. Ter desespero em relação à própria vida é a maior aceitação de falhanço e ao mesmo tempo a maior dignificação do tempo que te foi dado aqui.» Falava a minha língua. Calei-me e escutei. «-Só cá vim avisar-te porque foste a uma vidente. Não gosto que recorras a privados para serviços espirituais estatais, deves seguir as vias oficiais.» O anjo da morte tinha sentido de humor. «-Não tens motivo nenhum para desesperar da tua vida. És um sortudo e privilegiado pela mesma, és é demasiado orgulhoso para o poderes ver. O orgulho tolda-te o espírito que se fecha cada vez mais sobre si.» «-Ó anjo da morte, da minha morte, é fácil para ti falares que nunca encarnaste. De fora, de carne espiritual é fácil falar. Olho o predador matando a presa, cuja única ofensa ao mundo foi existir, e choro. Não por lágrimas físicas, mas desejando que não fosse o mundo assim, mas é. Vejo as patas, as penas ou barbatanas no último estertor e penso que não posso ser deste mundo. Não queria que um morresse comido nem outro à fome. Tenho nojo, asco, à morte. Qualquer indivíduo que desapareça, é para mim uma tragédia, que contrasta paradoxalmente, este mundo é uma merda e não consigo deixar almas que estão prestes a deixá-lo. Dou por mim a tentar salvar ratazanas, pássaros que se perdem do ninho, cachorros mal afogados à nascença jogados no caixote do lixo por um filho da puta qualquer. Dou por mim a desabar em choro compulsivo quando não consigo salvar nenhuma vida. Tento salvar pombos moribundos que encontro à beira da estrada, até caracóis que saem com a chuva apanho do chão e mando para a erva alta para ninguém os pisar. Não é por ser bonzinho, que não o sou nem quero ser, é porque uma voz dentro de mim me diz que sou responsável pela vida do meu próximo.» «-E tens razão, a Morte não é deste mundo.» Dizendo isto aponta-me o indicador com aquelas falanges descarnadas e diz «-Além do mais, a tua cruz é essa, demasiada clareza de pensamento para o teu bem.» «-Clareza de pensamento? Deixa-me rir pá. Se o meu pensamento fosse claro eu saberia as razões por detrás das acções dos outros. Porque aquela colega no Facebook me ignora as mensagens, porque não bloqueou logo? Para proteger o telemóvel da vista do namorado? Mas se eu nunca lhe sugeri nada…Afinal serão as mulheres que só pensam em sexo e que qualquer gajo que fale com elas apenas as quer comer? Que merda de ética é essa, em que se reifica um para protecção de outro? Que discurso prodigioso contam a si mesmas para justificar a falha moral que cometem? Que capacidade é essa de conviverem com a hipocrisia de não querer que outrem seja cortado do seu mundo virtual, apenas lhe cortando o direito a qualquer palavra, como se achassem que isso não é fácil de descobrir? Posso continuar ad aeternum. E daquela que continua o seu périplo de borboleta, lixiviando cada atitude de merda, à noite como Penélope tecendo fios, no final da manhã está sempre ilibada. Usa-me a mim e a outros para se vingar do namorado e para preencher ego seco e tardes desocupadas e monótonas. Desculpa-se para dentro repetindo que também a uso e portanto ambas reificações anulam-se e assim está tudo bem. Por isso a projecção de vício no outro, a qualquer custo, é condição sine qua non para a sobrevivência do próprio ego. Ou seja, o indivíduo safa a sua pele, imolando a do outro. A consequência das minhas acções anulam-se se a narrativa que tenho das acções alheias as fizer iguais ou piores que as minhas. E aí temos um dâimone, uma violação continuada de outros, dos seus sentimentos e das suas espontaneidades, por uma ausência de carácter acentuada com o declínio da captação de validação masculina. Ou a outra que sempre que lia as minhas dedicatórias nos livros que lhe oferecia louvando a sua personalidade, me fazia a mesma cara que a mãe da Paula, como que se olhando para um enfermo mental acometido de loucura momentânea, como se soubesse que nada era daquilo que o apaixonado vê. Ou as outras que cospem para o ar que os homens são manipuladores ou só pensam em sexo, mas eu escrevi poemas a todas, e nenhuma me escreveu a mim. Nenhuma me ofereceu rosas. Nenhuma foi honesta e frontal. Não sou chauvinista man, apenas observador. Raça do caraças, tentando condicionar, influenciar e anular, para testar a firmeza da personalidade do outro. A mulher é por natureza, o verdadeiro bully. Se perante força de resistência, diz que somos brutos insensíveis, se permeáveis a cada capricho, frouxos que detestam. Se somos correctos, directos, desprezam-nos porque não sabemos jogar o jogo. Ás amigas queixam-se de que os homens não sabem o que querem, quando os que as levaram com falas mansas e bolos, as comeram e largaram. Claro, para proteger o ego, ai de alguma que pouse a cabeça na almofada e pense ‘Epá, fiz merda.’. O erro, a falha são vistas por elas como ataques a si próprias, como que se o aprendiz fosse responsável por ainda não saber fazer melhor. De onde não tiram benefício algum, largam como o diabo foge da cruz, nem que seja preciso esperar pela ocasião certa, ou seja, só larga a liana de trás quando garantir preensão na liana dianteira. Diz-me, meu anjo, porque hei-de eu esperar códigos morais de quem não os tem? Ou a outra, deixa-me contar-te esta, que procurava nitidamente um macho de acordo com o seu percebido estatuto social. Que havia estudado 12 anos para ser cirurgiã como se 12 anos fosse algo de homérico. Eu disse-lhe que estudava há 23, e ela cuspiu de soslaio, aparentemente só o campo dela confere dignidade. Isso e viaturas novas com IUC alto. Anjo, só respeitam a força. Apenas.Somente. Não a física. Dominarem mentalmente um gajo hipertrofiado é só mais um troféu que mostram às amigas para estabelecerem as suas hierarquias de grupo de ‘amigas’. Os homens medem pilinhas, elas medem as filas de mendicantes do seu afecto, a quem nunca dão respostas cabais ou deixam de enviar mensagens contraditórias. Por natureza os mendicantes caem que nem tordos nisto. «-Ao que dizes João, só um problema de perspectiva.» «-Como assim?» «-Foste cá metido para fazeres a observação e resumo do que consiste ser-se humano. Enquanto te focares na dor que sentes, e no negativo, escapa-te o âmbito da lição a aprender. Livra-te de tanto orgulho. Não leves tão a peito este tipo de postura. Dá-te por feliz por não seres afinal tu, o pobre diabo que não sabe o que é estar vivo. Há quem ache que viver é um objecto brilhante em ninho de corvo.» «-Eu sei que tens razão, mas algo em mim fervilha por causa disto.» «-Claro, mata a fantasia e tudo ficará mais claro.» «-Como assim?» «-Já passaram os dez minutos.» Dei à chave e o carro pegou limpinho limpinho. No pino do Inverno, o ar quente entrava pela sofagem, e a janela aberta mostrava-me à frente as belas paisagens do Inferno, com as escadas para o Céu, um pouco além delas. |
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Outubro 2024
Tori Amos - Professional Widow (Remix) (Official Music Video) from the album 'Boys For Pele' (1996) - todos os direitos reservados:
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