Bem, a malta não acredita. Antes, eu pensava que era por causa da mariquice de a realidade suplantar a ficção. Hoje sei que é porque a maralha, acha sem ter muito a dizer ou decidir sobre isso, que o que se queixa de amor ou dos outros, é ele mesmo merecedor do castigo, ou pior, inábil a jogar o jogo que todos jogam mas de que poucos sabem as regras. Um ou outro oscila entre «-Eh, foda-se, isso aconteceu mesmo? Não estás a inventar?» Os demais respondem com silêncio desdenhoso, com uma cara de descrédito pelo que é ouvido ou lido, como se o narrado fosse uma historieta que conto para sair sempre bem na fotografia. Ou uma reacção nervosa às consequências da minha inadequação. Um ou outro, mais batidos, tratam-me como velho guerrilheiro, irmanado em velhas e conhecidas selvas. Olha, foda-se. Já sei que não fui feito para ser entendido, que se foda. Siga a Marinha. Estou encostado ao vão da sua porta do quarto, com a cabeça encostada num antebraço esquecido de si, feito apenas para acolher a minha testa suada. Dou por mim a pensar em todos os que já foram. Todos os corpos e almas que em enriqueceram a vida, me deram a honra de os poder conhecer, mesmo as putas indigentes que nunca conseguiram perceber a profundidade da sua indigência humana. O sentimento que emerge da lembrança deixa-me angustiado. Dava tudo para os ter por cá de novo, não quero que sofram ou morram, mesmo as que mais me fizeram dóidóis. Não é bem tudo, mas quase. Não quero que sofram, apesar de terem sofrido. Não quero que tenham vidas mais ou menos anónimas, apesar de as terem tido. Se algum deus me disser, olha, dás um colhão ou um braço e este ou aquela, voltam da morte. Eu não dava. Quer dizer, se calhar até dava, depende do quanto sinto a falta de outrem. Que se foda, sei que me entendes. O quanto gostava que os ‘meus’ mortos não tivessem sofrido. Que foram amigos ou conhecidos temporários, aos anónimos conhecidos de vista que se lançaram da ponte 25 de Abril, os que morreram de cancro, de acidente de viação, de desgosto. Se eu mandasse, nenhum morto poderia replicar em mim a dolorosa experiência da sua ausência. Sim, talvez seja cobarde. Atrás de mim, da cama, ela grita, «-Podes vir, vem comer esta coninha toda!» Tinha-me pedido 5 minutos, para vestir uma lingerie que me ia ‘deixar louco’. Quando a vi só consegui exclamar:« -Foda-se, isso é de velha!» Epá, umas rendas e uns cetins como se usava nos anos 80, a tipa vestira-se da forma que achara que me ia excitar. E eu, ó que caralho, eu disse a esta gaja que eram rendas de pescador, e o papo de cona bem gordo e convidativo para a minha boca por entre rendilhado análogo a cárcere. Esqueci-me de dizer que também há malta que acha que escrevo uma espécie de porno de cordel dos anos 70. Não tenho sorte nenhuma. Ela diz-me ‘-Desculpa? O que disseste? Não percebi!?’ Porra. Também não a quero magoar e a cavalo dado não se olha o dente. Tenho de fingir que estou excitado. Solto o reportório de gemidos monossilábicos e sei perfeitamente que a gaja sabe que estou a fingir. Soa a falso. Nem quero saber se fez de propósito. Vem com esta merda de vestimenta, que é a imagem reflectida da ideia do que acha excitante. Oh amiga, penso eu, achas que eu me passo com lantejoulas farsolas e batidas… Mordo-lhe o interior das pernas, e do nada recebo uma bofetada com toda a força, que me deixa o nariz a fungar molhado e uma espécie de campainha dolorosa decorrente dos sinais de dor áspera da pele na zona do impacto. Ao recobro, olho para ela para perceber o motivo da agressão totalmente inesperada. Franze os lábios naquela expressão própria dos filmes porno, e diz ‘-Come essa coninha, come!’ Passo a língua por dentro dos lábios, a ver se a dor aplaca, e antes que termine o trajecto, recebo outra lambada, desta vez com os nós das mãos. Alto e pára o baile. Digo-lhe ó amiga, não bato nem recebo, voltas a fazer isso e te garanto que te vai doer. E isto não é para ficar já por aqui. Devia ter ficado por ali, porque ameaçar, e não fazer, é cena de conas. Recuperei facilmente a tesão, com uns afagos que ia fazendo, e de novo, do nada, esmurrou-me, desta vez no sobreolho. Parou tudo, e olho, estranhamente, primeiro para ela, e não para as roupas que indicavam o caminho da rua. A minha curiosidade era ver se tinha partido a mão, que as gajas não sabem esmurrar. Pelos vistos não, e ainda olhava para mim, desafiante, expectante, à espera da minha reacção para aferir se eu era um conas ou não. Detesto violência, mas detesto ainda mais ser testado. Disse «-Eu não te avisei?» Ao que ela respondeu com um menear de anca, e uma cara de desafio, de boca aberta e quase que a dizer para eu dar o meu melhor. A minha bofetada saiu fraca. Pouco alarde, apenas o suficiente para pintar ou esguichar, a parede de vermelho vivo. Ao ver a coisa naquele nível, pensei para comigo, pronto, fodi a minha vida. Esta gaja faz queixa de mim e estou fodido. Sentindo-me querer virar, prende-me com as suas pernas, extraordinariamente fortes, como se estivesse numa guarda. Só que a guarda do Jiujitsu, é defensiva, e ela prende-me para aproximar a minha cara, para me esmurrar de novo, desta vez abrindo-me o lábio. Aqui perdi conta de mim, sei que quando olhei para baixo, a sua cara estava o dobro, e escorria-lhe sangue por todos os lados. Meu Deus. Que caralho fiz eu? Mais que o sentimento de estar fodido, estava em choque pela dimensão do dano provocado, pelos meus punhos. Eu sei o dano que podem causar, mas nunca o tendo causado, estava a ter um lidar difícil com essa constatação. Abano-a e pergunto se estás bem. Inclino-me para o telemóvel e começo a ligar para o 112, e ela estica o braço para mo desligar a tempo. Está consciente e não a reconheço por detrás das lesões, disforme, inchada, amassada. Devo-lhe ter dado uns 3 ou 4 estalos com força, mais que isso, teria morto a pessoa. Coloca, os braços à minha volta, puxa-me para baixo e sussurra-me ao ouvido: «-Nunca fui tão bem comida. Não te preocupes, podes ir.» Foi cobarde da minha parte, mas fui. Tapei-a, deixei faze na mesa de cabeceira, e água oxigenada. Dormia serena e descansadamente. Fui-me embora e a minha vida só voltou a ter paz quando a vi na rua, totalmente recuperada, de uns 2 meses a esta parte. É tão fácil mandar os princípios às malvas quando é o nosso rabo na jogada. Felizmente, mesmo que conte a alguém, ninguém acreditaria em mim.
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