Au revoir

Ela andava pelo quarto à procura da roupa, cantarolando alegremente como se a vida lhe tivesse sorrido.


Tentei não mexer-me e aproveitar o lençol que me cobria o rosto o suficiente para não ser visto acordado e a ver por entre a opacidade da trama, os movimentos daquela que eu esperava que saísse com a cortesia de não me acordar. Não queria ter de lidar com comportamentos de circunstância.


Tenho um fraco por mulheres de cara triste, e olhos encovados, ou com grandes olheiras. Esta fraqueza já me levou a envolver com cocainómanas e pacientes de esgotamentos, bipolaridades agudas e mulheres queimadas para a vida.


Algo de errado em mim associa a tristeza de um olhar a uma promessa de introspecção e contacto com a fatalidade da vida. De libélulas bem-dispostas e fúteis estou há muito cheio. Só uma pessoa triste pode amar, trata com pouca ligeireza o sentimento, e sabe dar o valor a um parceiro que o ocaso a si levou.


Para a libélula feliz, há sempre a promessa de felicidade num horizonte futuro sempre adiado.


Não me lembro do que se passou entre mim e esta. Sei que nos encontrámos ontem no Bairro, mas o facto de estar a cantar, não augura nada de bom.


Sei que estou a fugir dela, a fugir do sentimento de extraneação que é ter de lidar a partir do quase nada, com alguém que começamos a conhecer e a recriar os padrões de conforto mitigado a que nos habituámos em relações passadas.


Pousa-se sobre mim, diz que adorou e que depois me liga. Sinto os seus mamilos duros roçando no meu peito e apetece-me abraçá-la e fazer de uma vez as pazes com a minha revolta.


Damos um beijo e ela sai da porta cantarolando e olha para trás apanhando-me a espreitá-la, ri-se.