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Estrada de Damasco (II)

19/12/2013

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Alguém algures disse que no amor e na guerra tudo é permitido.

Não vejo necessidade de distinção.

O amor é a continuação da guerra por todos os meios.

Sim, tu gostas dela, e ela gosta de ti. Mas a que esforços se dedicam para chegar ao fundo do outro, para se arrancarem à mediania da mediocridade onde um mundo consensual e balizado vos fornece os contextos em que se conhecem?

É guerra. Nada mais que guerra. Schopenhauer dizia-lo, não sem um amargo de boca.

Pura, cristalina, sem remissão, sem quartel, sem qualquer pensamento de derrota. Guerra, total, urbana, civil, fratricida.

Guerra.

E no entanto só tu és acusado de ser soldado. Para ela é sobrevivência.

Ai, os homens são todos iguais, mentem com todos os ossos do corpo, fingem, manipulam, representam. Escutas isto geralmente da boca de quem passa 2 horas por dia a maquilhar-se para ir ao supermercado mais próximo. Ou de alguma mimada a quem a beleza concedeu alguma ponta de arrogância.

Tu sabe-lo. No jantar com que a fisgaste, meteste o teu melhor fato, e até a tua barriga era menor porque cuidavas do teu aspecto. Queria-la tanto na ponta da tua boca, que afogaste o sentimento de estares a ser falso, fingido como se fizesse parte da guerra, e como as coisas são assim.

Fingias ser porreiro avesso ao ciúme e à posse, sensível e moderado, ou estouvado e imprevisível de acordo com o que manipulador lias que ela procurava. Mentias a ti mesmo, que engraçavas com a miúda e que os teus critérios nada tinham a ver com um apresentável rosto simétrico, um par de mamas e um rabo apalpável e invejável.

Fingias ser respeitável e sóbrio, e até ofereceste prendas aos pais dela no Natal, até a emprenhares e garantires tua.

Fingias ser o mais útil e ajuizado dos homens caindo no fosso de tentação, de lutar sempre pela aprovação de familiares e amigos dela, de forma a que ela perceba sempre que é uma tonta por te largar, que grande partido és que já nem te reconheces, até porque nunca te conheceste.

Depois de a fazeres casar, mas não convencido do anzol de latão no seu beiço, é outra maratona que começa na tua degradação, que pintas com a cor falsa da maturidade que tem de ceder, escondendo o jogo, a guerra.

Vestes bem, és extra simpático e atencioso com ela nos jantares de amigos, onde te esforças por impressionar não vá ela perceber que és uma fraude. Extra defensor das mulheres como se precisassem de defesa tua, só para agradares e garantires a tua dose de cona conjugal.

Tentavas impressionar na cama, ansiedade de performance levava-te a perguntar se ela se tinha vindo ou se tinha gostado.

Perdias minutos que pareciam horas nos preliminares, e depois de te vires davas-lhe beijos e afagos na cabeça, a não ser que nela lesses que tomava isso como sinal de fraqueza tua.

Se fodia bem abrias-lhe as portas quando andavam na rua, se não fodia, ainda eras mais servil para continuares a garantir a dose de mau serviço.

Passavas horas lambendo aquele clitóris, até te doer o maxilar só porque teimavas que ela tinha de te pensar como o melhor amante que conhecera, e não te querer trocar por outro.

Fingias que não querias estar longe dele, e assim que em privado saltavas para aquele jeito teu de não tomar o primeiro passo muito obviamente apenas o suficiente para ele pensar que o desejas. Em loucuras calculadas baixavas-lhe as calças e lambias-lhe o falo com a mestria que tinhas aprendido na tv ou na tua peregrinação amorosa, mais entregue a perceber o mecanismo que em te entregares ao momento, afinal podes ter homem com um estalar de dedos.

Ele adorava-te por isso. Assim que te abria as portas, e te colocava gentilmente a mão nos rins quando te tratava como princesa, sabias que as outras por aí não estavam a fazer um melhor serviço que tu. Fodiam como coelhos, até que te começaste a fartar de meter a sua pila na boca, com cabelos e cotão das cuecas de algodão que usa.

Nojo, é por ali que ele mija, e assim que queres ele dá-te a água para apagar o fogo do teu desejo, para que não lucrar com isso obrigando-o a tratar-te bem? Não sejas parva.

Só o impressionas até garantires o anzol de aço bem cravado nas suas guelras.

Sabes que ele não vai a lado nenhum. Ele sabe que tu não vais a lado nenhum. És boa para mulher dele e ele para te criar os filhos. A reificação anula-se bidireccionalmente.

Ele fode por fora, outras que lhe dão o que lhe deste ao início. Ela fala de outros com as amigas quando saem e tu pensas que falam de crochet.

Não há dia que um colega de trabalho não a assedie, e ela não responda com um sorriso de quem sabe talvez um dia, ou de que finge que é só simpatia por parte do aspirante que manda o barro à parede.

Por vezes até ele fica tão desleixado que começas a puxar por ele contrastando com o moreno de colarinho imaculado e bronze windsurf que todos os dias te diz que tens um sorriso cremoso.


E tu estás presa a um voto, que é apenas um voto.


A corda ensebada perdeu o brilho e tu o ascendente. Tatuas estrelas na mão ou piercings no umbigo, ele na perna da bola e faz penteados tomahawk.
Ele imerso em novas actividades que o façam dinâmico a teus olhos, ela cada vez mais adulta e entregue aos filhos, fazendo-o sentir um poucochinho culpado por não conseguir igualar em amplitude o sacrifício.

Ao fim de uns anos, se ainda continuam juntos e os filhos não de pais separados, amoleces as mãos ao calor da lareira e perguntas-te que caralho é aquela pessoa que cintila por detrás de uns olhos apagados.

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