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Egos are girls best friends III

3/4/2023

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Fotografia
«A mulher é o maior detector de fraqueza.
Como tubarão alacre e sedento, fareja nosso sangue à procura das vulnerabilidades que nem temos consciência de possuir em nós.
«-Ama, sê romântico!» dizem as vozes de todos os quadrantes, num apelo a que o cordeiro entre na boca do lobo.
A mulher é o maior predador ao cimo da terra, e tal como a orca, apenas come as partes da presa que lhe interessa, a língua da baleia, o fígado do tubarão-branco, a cria da foca.
A mulher vive do coração degustado, da auto-estima de outro ralada, da ilusão de ser algo mais na vida que uma massa em movimento constante sob as águas, em busca do seu interesse próprio, com umas guelras que a fazem morrer se alguma vez parar.
Com olfacto apurado para a fraqueza da vítima, escolhe desde logo, se a mata, se a come, ou se lhe passa ao largo, se nenhum interesse ou ganho daí venham.
Está um gajo a perceber como se manter à tona, e em círculos à nossa volta vemos o predador olhando, avaliando, sob que critérios, perguntamos para dentro. Ao fim de algum tempo, ficamos tão familiarizados e contentes por alguém parecer girar à nossa volta, que estendemos um braço para fazer uma festinha. Tornamo-nos próximos, e quando pensamos que por fim não há perigo de vida, é quando a dentada vem, directa ao coração, onde o sangue arterial mais fresco e oxigenado está. Obtido o pretendido, voltamos a ficar sozinhos, sustendo respiração para ficar à tona, com um bocadinho menos sangue que nos afaste da hipotermia, com mais um assunto para nos desviar a atenção, com mais um motivo para acreditar que nascemos para sermos apenas comida de peixe.»
Não pude deixar de rir com este meu discurso, que de tão dramático parecia teatral. Onde raio fora eu buscar estas ideias?
Ah, agora me lembro, um convite para uma palestra em Carregal do Sal, num qualquer clube de leitura que dedicara Janeiro a um livro meu.
Ao ver uma plateia quase completamente composta por mulheres, e à invectiva de uma que me acusava de ser misógino, respondi com este discurso.
A sala estava em silêncio, e os dois ou três gajos presentes estavam mais apreensivos que eu, tentando perceber qual era a recepção por parte das cachopas, para poderem mostrar adesão à opinião das donzelas, e assim, poderem aproximar-se mais do prémio. É uma estratégia, que não condeno.
Contrária à minha, contudo, que nem é inteligente, confesso. Aliena-me metade dos potenciais leitores, e torna menos fluido, o fluxo de gajedo na minha direcção. Anula por completo a minha ilusória imagem de prémio, prostrado aqui neste púlpito, que o gajedo gosta de coisas altas e brilhantes.
Misógino, eu?
Foda-se, se não gostasse delas, falava de outra coisa.
Mas entendo a invectiva da gaja que me acusou.  É a forma mais fácil de me calar. De me desvalorizar, anular alguma ponta de pertinência do meu discurso. Ah odeias, fizeram-te dóidói. Ai de ti que digas coisas más sobre nós.
As mais racionais dizem que não posso generalizar e têm razão. Mas longe vão os tempos em que as punha a par da biologia evolutiva, e ficava a olhar para a cara delas, onde diminuía a taxa de interesse por mim, catalogando-me como geek. Nos dias que correm, não temos o direito nem a ser estúpidos, nem a sermos alguém que tenta encontrar e partilhar respostas para os fenómenos no mundo que nos rodeia.
Passo assim, pelos sítios para onde me chamam, como torpedo saído da boca de uma fragata, em direcção ao alvo e sem olhar para os lados.
Ah mas os homens também são cabrões e boa parte também tem falhas de carácter, responde ela depois da minha resposta.
Mas disse algo em contrário, devolvo eu. Aliás, exponho mais as minhas falhas de carácter nos textos, que as coisas más sobre as mulheres de que me acusas.
A sala começa a ficar inquieta, e as caras de indignação a ficar em brasa.
A promessa de peixeirada faz algumas levantarem-se da cadeira e virando o rabo para mim, sair pela única porta do auditório.
Aprecio os traseiros, enquanto uma e outra vão pedindo a palavra, empolgadas pelas acusações umas das outras à minha pessoa. Uma mentalidade de grupo, que como grupo de chacais, abana a carne inerte da presa, abandonada de vida, com a violência da vontade de matar. Desnecessariamente.
Em grupos de 3 e 4 ao mesmo tempo, ululam, em crescendos de ira e raiva, chamando-me nomes, rasgando livros escritos por mim, que compraram.
O promotor da editora, em pânico, esbraceja, pede calma, e olha para mim com um olhar desamparado de quem nada pode fazer acerca da natureza de um ‘anormal’.
Penso em mim, no que sinto, no frio e desapegado estado em que estou. Tudo me parece um filme, uma piada idiota que espero que termine, que as luzes se apaguem e eu com elas. Desapegado de tudo, nada realmente tem importância para mim, excepto, calcar mais a ferida a estas putas, polarizar mais o seu ódio, fazendo-as perder a razão pelo excesso de emotividade. De nada adiantaria notar que a nenhuma ofendera directamente.
Que a uma que diga que os homens são todos x ou z, eu interpreto como sendo ela a imbecil responsável pela generalização a partir da limitação subjectiva, que ao facto indesmentível que existem homens com as propriedades x ou z.
As palavras ficam com quem as diz, e às generalizações, devemos olhar com os olhos de quem as profere. Reduzir cerca de 4 biliões de pessoas a uma frase unificadora de tanta gente, só revela que a oradora parasita uma ideia negativa que a faz sentir bem consigo própria.
Generalizo eu as gajas? Não.
Retirar padrões acerca da minha experiência subjectiva, é generalizar? Se é, não é diferente da generalização das dondocas que me chamam nomes em micro grupos de apoio.
O que há aqui senão dualidade de critérios, e asfixia da minha liberdade de expressão?
Uma aproxima-se da mesa, com o punho fechado, a cara vermelha, e ao falar as palavras saem de mão dada com saliva projectada no ar.
Volta para trás várias vezes, tentando mostrar às outras estar mais investida na causa comum, de se sacrificar pela missão.
De bom grado me mataria, creio, ou humilharia, se granjeasse prestígio e posicionamento social.
Facilmente matamos os outros, ou lhes tiramos a palavra, se algo ganharmos com isso.
Para ela, eu deixara de ser humano, em parte, creio. Não conseguimos amar quem achamos feio, e eu para ela era o bode expiatório personificado de tudo o que lhe correra mal e odiava no mundo.
Rio-me, com a mão à frente da boca, para não acicatar mais os ânimos, com esta verdadeira macacada, e com o sentimento tão intenso para com um tipo, eu, que apenas escreveu umas linhas num livro.
Não tratei nenhuma das indignadas, de forma indigna, nem pelo seu nome, nem directamente, nem indirectamente. Teci umas frases e umas personagens, que podem servir de carapuça, portanto havia a perceber de onde vinha esta adesão emocional à causa. Além do claro espírito de grupo do auditório.
Uma ou outra, pedia para falar e dizia estar incrédula, pelo linchamento, relativo a uma obra de ficção.
Outra, sobre o meu direito a ser estúpido. Que não podemos mandar os estúpidos para campos de concentração onde os gaseamos até que desapareçam. Que temos de saber viver com eles, e até, lidar com o facto de não lhes podermos retirar agência ou dignidade. Que é dignidade que perdemos quando todos nos censuram, nos acusam, nos recusam o direito de sermos levados a sério ou de termos uma opinião diferente.
Outra perguntando que lei havia eu quebrado que justificasse o auto de fé.
O meu riso passou, a determinada altura, quando percebi o quão polarizadas andam as pessoas umas contra as outras. O que me assustou, ao mesmo tempo que me fez ainda mais reagir de forma irada e gutural ao que percebia estar em jogo.
Esta corja de putas e labregos, a reboque das modas do pensamento do parecer bem, tornam a vida dos outros num Inferno, para que se sintam bem consigo mesmos. Ninguém regista esta canalhada, daqui a uns anos uma nova moda, paradigma, zeitgeist, surge e lavam as mãos como Pilatos do mal que fizeram a outros, sob a desculpa da justiça social da hora.
Comigo fodem-se que nada tenho a perder. Não faço dinheiro dos livros, e por isso é irrelevante se os compram ou não. O que me irrita nem é a parolice da adesão à moda. O que me irrita é a arrogância de acharem que existe uma mundividência tão óbvia que os que não aderem o fazem ou porque não entendem ou porque se recusam teimosamente.
Cerca de um terço do auditório ficou vazio, e apesar de ter os tímpanos saturados, noto que o ruído acalmou, e aguardo mais uns minutos.
É como atender um cliente irritado num call center. Deixá-lo esgotar toda a energia e indignação, até se cansar, literalmente.
E depois propor solução, ou algo que, ventilada a emoção, lhe pareça aprazível, e sinta que ficou a ganhar algo.
No caso do texto que vim aqui comentar, continuei eu, a mulher de facto é um detector de fraqueza, porque ambos os sexos se revêem um no outro.
De nada adiantaria soprar arco-íris pela peida feminista acima, iria sentir que era falsa a contrição e que ia sentir o sabor de uma vitória.
Portanto, insisti.
É impossível descrever um ponto de igualdade onde uma suposta reparação de ofensas feitas, é total.
É um processo revolucionário em curso e sem fim à vista. Para obter vantagem na vida, o oprimido de outrora, de forma capitalista, irá sempre acenar com a bandeira que funciona e lhe granjeia vantagens. Ajuda até pensar nos outros, sempre como opressores.
Por outras palavras, vemos quem somos, olhando nos olhos uns dos outros.
Quando menos esperava uma espécie de remissão, foi quando as palmas surgiram.
Creio que foi pelo soar bem da frase, que compensou a ofensa prévia.
Mudada a percepção, fui aplacando a incisão do meu discurso, e no final, nos autógrafos, as mesmas pessoas que me chamaram nomes, vinham elogiar e tirar de esforço, é assim levei a mal, mas depois de explicadas as coisas é impossível ficar chateada com o mal entendido.
Mal entendido, precisamente. Se bem que se me perguntassem de novo, de novo daria a versão directa que a, as, fizera querer ver-me morto, meia hora antes.
De modo que, estando habituado, e não me importando que me odeiem, estava relaxado e até divertido, especialmente com a que tanto vocalizara de forma húmida contra mim.
Aproximou-se e estendeu de forma constrangida o livro para que eu o assinasse.
Perguntei-lhe o nome e escrevi «-Obrigado Magda, pelo apoio em forma de abraço que testemunha a comunhão das almas.»
Quando leu ficou ainda mais constrangida e ruborizada. Apeteceu-me perguntar-lhe se não era eu a mesma pessoa, que tanto a irritara.
Quando saíamos do auditório, e em minha volta, as mais indefectíveis finalmente se fartavam do meu sorriso, ela veio ter comigo, naquele som típico das botas de cano até ao joelho, sob soalho de pinho encerado recentemente.
Agradecer-me a dedicatória e fazer-se convidada para algo que eu conseguisse propor.
Ao ver a serra ao longe, bebia um gin adocicado intermitentemente pelos beijos que a boca dela depositavam nos meus lábios.
Fez uma fita, e divertindo-se, de forma malandra, fintou a minha boca e colou seus lábios no lóbulo da minha orelha, perguntando se queria ir a casa dela, provar outro gin.
Como não respondi, e só me ri, perguntou porquê.






​
E eu respondi, vocês são todas iguais.»
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