1 I Encostei-me num poste zincado que fazia sombra neste parque no meio de Bruxelas. O calor do Verão, um saco de batatas fritas divinais, na fritura e nos molhos que metem, e no chão uma lata de cerveja Jupiler, e estava eu bem a observar as pessoas, rua acima, rua abaixo, e ia olhando fixamente para uma miúda na roulotte onde eu comprara as batatas, se me visse a olhar e intermitentemente olhasse para mim, significaria que estaria aberta a uma abordagem minha, ou ligaria às autoridades que por aqui, andam de metralhadora nos aeroportos. Devia ter pouco mais de 18 anos e já me afogava o meu saco de papel branco com recheio de batatas, com a baba que me escorria pelo queixo, só de imaginar eu e ela enrolados sem roupa num destes campos agrícolas, onde as perdizes parecem galinhas, as lebres parecem cães de médio porte, e os corvos reunidos em círculo nos campos antes da sua jorna, parecem perdizes. Não olhou, ou se olhou eu não vi. E até era melhor assim, deve ter um salutar asco a homens mais velhos, tal como eu tinha a mulheres mais velhas quando tinha a idade dela. É delicioso ver o quão bem funciona a Natureza a partir de dentro de nós, o jovem sente intrinsecamente ter um valor qualquer, para o qual, é desperdício permitir que caia nas mãos dos mais velhos. Uma forma, talvez, de a Natureza unir os jovens corpos, os mais capazes de gerar perpetuação, quando a replicação de carbono ainda é certinha como viçosa. Além de que não falo muito bem francês e não consigo aferir se alguém na roulotte é familiar ou namorado dela. Não são desculpas, devoraria aquela prece de carne branca, cabelos loiros e olhos azuis, aqui no meio do parque, provavelmente alguém meteria uma moeda na covinha do meu traseiro, que para estes europeus, tudo é arte de vanguarda. Prefiro-as mais velhas, mas por vezes, a chamada química entre os indivíduos sobrepõem-se ao gosto pessoal, o que faz sentido, pois nem sempre somos nós que estamos em controlo do que é melhor para a espécie. E no meu caso havia química. A comprovar, o barrote que se mantém, desde que ela me passou o pacote de batatas fritas para a mão, o que me fez encostar no poste, como se me protegesse do Sol, não fosse o caso de estar com o rabo esticado para trás, para disfarçar a erecção visível através dos calções da Decathlon. O meu colega foi comprar tabaco e um isqueiro, tento pensar noutras coisas e olhar para longe dela. À minha frente passa um tipo com ares de muçulmano, se não era, era um cosplayer religioso. Já os tinha visto em grande número, na estação de serviço, com o rabo virado ao Ocidente, a orar na direcção do seu centro religioso, ajoelhados, concentrados, e plenamente adaptados. Dei por mim a pensar, no que me aconteceria, se orasse virado para Roma, com uma cruz ao peito, no Qatar, Dubai, o que seja. Se em vez de batatas fritas, numa roulotte qualquer, pedisse uma bifana. Os países muçulmanos já foram dos mais tolerantes, mas depois de algumas radicalizações, nem todos. Passa a minha erecção, com estes assuntos. E passa também, a cerca de 3 ou 4 metros do primeiro, uma mulher vestida com os trajes delas, onde apenas se vê os olhos e pouco mais. Nesta saía o cabelo, loiro, e um olhar azul de contentamento. Pela mão trazia dois filhos e ligeiramente á frente uma senhora mais idosa, da mesma tez do primeiro. Imagino que fosse a mãe do tipo que estava casado com a tipa que trazia os filhos pela mão. Constatei vários casais deste tipo, e lembrei-me dos casais mistos em Lisboa, que coerentemente são maioritariamente compostos de um negro com uma branca. É mais raro ver um branco com uma negra. Acho muito bem esta mistura de pessoas, mas não posso deixar de indagar sobre a disparidade na mistura das cores. Assim que a minha atenção se focou, contei uns 6 ou 7 casais, eles de ascendência não belga, elas, que passavam bem por Valquírias. Com o mesmo raciocínio, dei por mim a perguntar o que leva uma mulher europeia e ciosa dos seus direitos longamente adquiridos, a adoptar uma tradição, nem melhor, nem pior, de não poder andar ao lado do marido, na rua. Pelo menos nestes casais que vi, no meio desta feira estival, onde se vende todo o tipo de bugigangas, música, fogo-de-artifício, etc. Um pouco envergonhado comigo próprio, por estar a pensar sobre a vida dos outros, perguntei a mim mesmo, se eu não era já um dinossauro de tempos passados. Prontamente me respondi, que a mais reles forma de condicionamento e poder que usamos todos entre nós, é a de uma suposta adequação aos tempos, às modas, a tudo aquilo que tem a aparência do novo. E que para muitos neopositivistas, esta moda da inclusão, embora tenha iniciado de facto um movimento socialmente justo e desejável, se tornou numa espécie de ditadura ou hipocrisia. Como dizia Nietzsche, os opostos nascem dos seus contrários, se bem percebi. Será que por exemplo, a opção por um marido negro nada tem a ver com o indivíduo, mas com uma adequação aos tempos? Mas estou aqui numa paisagem bonita, inebriado pela cerveja e dou comigo a pensar em assuntos que nunca me darão uma resposta. Será que isto tem a ver com aquela vez em que organizei com outros uma festa Erasmus na Faculdade de Letras, e convidámos um grande número de suecas que vieram naquele ano, e estávamos todos convencidos que a festa ia acabar bem, quando elas passaram todas por mim, e outros, como se fôssemos invisíveis, e foram falar com uns estudantes do Senegal, que naquele ano também tinham vindo em grande número? Tu conhecia-los a todos, pois jogávamos basquetebol na equipa da faculdade. Será que sou racista, por ter este tipo de pensamentos, e devo ser tratado num auto-de-fé? Apeteceu-me ir às redes sociais e perguntar ao mundo, se por ter estes pensamentos pecaminosos, sou uma má pessoa, e qual o castigo que mereço, 20 avés marias, ou torniquete no pescoço. Do que eu me fui lembrar, da minha Faculdade de Letras de Lisboa. Aqui em Bruxelas. Sentia-me tão longe que a lembrança parecia sonho. Um toque no ombro acorda-me das inutilidades que estava a pensar e a lembrar. Que da parte da tarde tínhamos de ir a Leiden. Mas é quase meio-dia, disse eu. Almoçar e não almoçar chegamos lá por volta das 17. O reitor queria falar connosco por causa do projecto de investigação. Olhei para baixo e vi um saco plástico, ele riu-se e disse que comíamos pelo caminho. Tinha passado pelo supermercado e comprado umas sandes. Perguntou-me se eu não queria ir. Respondi que não, ele que fosse. Andava a chatear-me há duas semanas para ir com ele à zona das putas em Bruxelas, onde elas se expõem em montras, e metem um líquido qualquer que bronzeia, para parecer que estão mais ‘tonificadas’. Anda lá pá. Não meu, não ligo a essa merda, e até me dá náuseas. Vai tu. Uma semana mais tarde, já sentia os meus olhos chamarem por Lisboa a partir das escotilhas do avião. Chegado a casa, o meu gato estava zangado comigo por ter passado tanto tempo fora, e a minha cama não tão aprazível como as das residências universitárias onde ficara. Deitei-me cansado na cama e tentei dormir e não pensar no meu contributo para o consumo de oxigénio causado pelas viagens de avião que fiz no último mês. Quando acordei, quer a lembrança da minha alma mater, quer da loirinha da roulotte, pareciam algo como um sonho. II Ao atravessar a passadeira, fiquei hipnotizado com o par de pernas que dentro do balcão bancário, destes modernos onde o mármore do balcão que simboliza a solidez e a permanência, foi substituído pela transparência de tudo se ver lá para dentro, como que se assinalasse aos clientes que maroscas fiscais eram coisas do passado. Uma saia turquesa combinava bem com uns sapatos amarelos, curiosamente, isto para quem conseguia ir além do exemplar par de pernas. Apeteceu-se sacar do marsápio e ficar ali encostado à montra, a satisfazer o meu fascínio por aqueles dois membros assíduos de ginásio. Lá dentro, calculei que o gajo maldisposto me ia atender, mas calhou-me a portadora do par de pernas. Blusa branca, fio dourado encaixado bem no meio de um 38 aprazível, duas argolas douradas enormes em cada orelha, e um sorriso para lá do simpático. «-Olá, em que posso ajudá-lo?» Fiquei a olhar para ela, se desviasse o olhar, era porque estava aberta a uma abordagem. Apesar de estarem nossos olhos afastados pouco menos que um metro e meio. O ‘Metro e Meio’ era uma boîte na 5 de Outubro. Claro que a tipa não desviaria o olhar. Estava a trabalhar, era normal que me olhasse fixamente. Volta a insistir numa pergunta que não ouvi à primeira, em que podia ajudar. Respondi-lhe que «- Gostava de lhe fazer uma pergunta e um pedido.» Ela ficou apreensiva com a minha entoação, mas também ela se lembrou de que estava a trabalhar, e que existem clientes estranhos, ou com formas de expressão inadequadas, em relação a todos os outros bem-sucedidos nesta vida. «-Faça favor…» disse ela com bastante hesitação. «-Bem a pergunta, é se gosta de batatas fritas, e o pedido é para verificar porque é que o meu cartão de débito foi comido em Bruxelas.» A sua cara ensombrou-se com a minha pergunta, na exacta medida em que me comecei a rir com a expressão que usara, do cartão ser comido em Bruxelas. A minha mente não é das mais limpas, e quando uso certas expressões, levo logo para outros significados. «-Não estou a ver o enquadramento da primeira pergunta.» «-É apenas uma pergunta, a segunda parte é um pedido.» «-Não, são duas perguntas, a segunda é para ver o que se passa com o seu cartão.» «-Não.» insisti eu. «-A primeira é sobre si e pode negar-se a responder, na segunda, não pode negar-se a verificar o que se passou com o cartão, uma vez que faz parte da sua função. Sim, depois de feita a consulta, responderá à questão, mas a questão é originalmente, um pedido.» Comecei a sentir que a interacção estava perdida, e que dali para a frente seria só um chocar de cornos entre mim e ela. «-Porque quer saber se gosto de batatas fritas?» «-Porque quero ir jantar consigo.» A cara dela descompôs-se com a queda do queixo. Levantou-se da cadeira e foi atender ao meu pedido, sem me dar resposta, no que calculei ser a técnica costumeira do nem responder para acentuar o sentimento de culpa do interlocutor. Sem problema. Quando voltou, trazia uns papeis para pedir novo cartão, que o anterior caducara, e por algum motivo…fora comido em Bruxelas, como podia ter sido em Lisboa. Tratado do assunto, levantei-me e ia saindo apressadamente quando ela me chamou e me estendeu mais uns papeis, dizendo que me esquecera deles. Eram os duplicados daqueles que eu preenchera, presos com um clip, e no topo superior esquerdo, um cartão de visita, profissional, com o número dela. III Liguei-lhe a um Sábado. Vou para os lados de Belém, beber um gin, queres vir? Encontramo-nos lá. Efabulei encontrar-me com ela debaixo do Padrão, e espetar-lhe um chocho com língua, e ela dobrando a perna à maneira dos filmes a preto e branco, exultando por ter encontrado o pai dos seus filhos, apesar de já os ter de outro prévio. Mas encontrámo-nos junto aos pasteis de nata, ela havia deixado o carro em frente. Onde é esse gin, é ali, e iniciei a conversa da treta costumeira nestas ocasiões. Quando ela me diz que não é costume sair com clientes, eu respondo, rindo, que não é meu costume sair com quem tem a mão no meu bolso. Demorou, mas acabou por se rir, apesar da piada não ser muito exacta e engraçada. Fiquei a saber que me queria agradar e que a sua presença exprimia a decisão tomada de me foder, se e somente se, eu não estragasse tudo com algo saído da minha boca. Era só gerir a vitória antecipada. Evitei, portanto, exprimir as minhas opiniões, brindei com ela apenas duas vezes, enquanto olhávamos o Sol a afundar-se no Atlântico a partir ali da Barra do Tejo. Uma brisa de fim de tarde vinha trazer um carácter saudosista ao ambiente, e o sorriso constante no seu rosto, indicava ser possível estar-se a divertir ali, comigo. Vou mijar. Quando volto puxo por ela, para que fale mais do que eu, apesar de ela ter o mesmo intuito, eu aproveito os espaços mortos da conversa e sempre que possível toco-lhe, na mão, no ombro, para que se vá gradualmente sentindo mais próxima de mim, sem necessidade de colocar máscaras entre nós, ou de manter ferreamente, a personagem que desempenha. Ao terceiro gin, a que não se negara, para equiparar-se à minha pose imperturbável, solta-se mais um pouco, e com o sentimento de segurança, desinibe-se mais, e revela pormenores da sua vida fechados até agora. Da relação com o pai da filha, das aspirações do tempo de faculdade, da ascensão bancária desde o tempo em que ganhava para as propinas no ISEG. Obviamente, dizia do ex, aquilo que Maomé não diz do toucinho, e apesar de tudo tivera prole com ele. Outrora, eu analisaria a coisa da perspectiva de quem analisa uma mundividência manca assente em ilusões, mas com o tempo, a regularidade milimétrica dessas ilusões em diferentes indivíduos, tornaram-se linhas de força, o que fez não só reduzir a ‘mulher’ a um títere de outras forças, como relativizar os meus erros com ‘elas’, pelos mesmos se revelarem como nada mais que decorrentes de premissas erradas. Eu retirara a animalidade à fêmea, colocando-a a meio caminho entre homem e deus, apenas por as perceber com mais poder do que eu. Mas que poder amargo esse. Poder apenas durante uma curta janela de tempo. E completamente alheia ao indivíduo. Olhando para ela, fui avassalado por um sentimento de pena, de lamentar a crueldade desta merda toda, que nem todos percebem. Aliás, que quase todos recusam porque lhes ajuda pensar que eles próprios e próprias, estão acima disso. Em mim, também o gin batia, e ao pegar-lhe na mão, recebi na boca os seus lábios, e tal como sorrimos de volta para a Morte, dei-lhe um chocho com língua, que não terminou connosco a foder em cima da mesa do pub bar, porque escorreguei na borda redonda ao meter o cotovelo em falso, caí de lado, e tive de ir mijar de novo. Quando voltei, sentei-me, ela aproximou a sua cadeira da minha, e beijou-me na cara, e fez uma cara de felicidade plena, sabendo que eu a estava a ver pelo canto do olho. Mesmo com o gin, tudo isto me parecia demasiado rápido, sem envolvimento emocional que sustentasse uma tão rápida adesão de ambos, a um poente magnífico com o mar como testemunha. Soava a falso, mesmo pensando que ela era uma pessoa que eu não conhecia, e que portanto, não podendo pagar o justo pelo pecador, não podia entender este indivíduo, inserido num mesmo saco de outros que após mais interacções, podiam receber uma mesma etiqueta. O que é sempre relativo, pois, nada tem que ver com os indivíduos, mas com a sua personalidade, e como esta reage aos instintos primatas que todos carregamos em nós. Podem fingir durante algum tempo, mas é quando já nenhuns interesses têm em nós, que revelam como realmente pensam. Não é que a mulher seja uma puta por ser mulher, ou algo de hediondo. Todo as falhas de carácter que podem ser arrebanhadas como comuns entre indivíduos, emergem do mesmo facto, de o pipi valer mais que a pilinha. Talvez ao longo de milénios os homens tenham adubado a terra com os seus corpos caídos em batalha, para equilibrar o valor da pilinha nos grupos alargados e urbanizados de primatas. Talvez tenham entrado em batalhas, para satisfazer a acumulação de recursos que as mulheres adoram. É por saber que ao dobrar da esquina espreitam dezenas de pilinhas, que o pipi se sente seguro e com os critérios em cima, com o poder de decisão de facultar o seu corpo ao mais alto licitador. É por se sentirem estrelas, que tratam os pretendentes como satélites. Não fingem, pura e simplesmente agem ao sabor dos ‘sentimentos’, e como não precisam de introspecção, são más observadoras de si mesmas no plano psicológico. Só tarde, conseguem pensar sobre as escolhas e acções que tomaram na vida, e sempre com o pó que lava mais branco do ego, para racionalizar as interpretações dos acontecimentos à luz que melhor proteja…o ego. Mas extrapolo, quero comer esta gaja e não me posso dar ao luxo de a tratar como um ser humano regido pela racionalidade etérea. Não. Não pode ser, mesmo que o outro se reja por ausência de um código, eu não posso ser assim. Devo então fingir, ou que sou parvo, ou que sou o que procura. Se sou o que sou, serei tomado como o Sócrates que andava nas nuvens e nada percebia deste mundo, pasto, portanto. Pasto para os herbívoros que vivem sob o mesmo comprimento de onda, de mãos dadas nas mesmas ideias e formas de olhar para o mundo. Na segurança do número. É vê-las pelas redes sociais, laikando umas às outras, como os cães lambendo rabos por motivos de socialização. Elas e alguns deles, que por lhes validarem as fantasias, acham que realizam as próprias. A mensagem não interessa em conteúdo desde que a conclusão final seja um sorriso acéfalo, prenhe de soberba, laikando-se umas às outras, ficam com o sentimento que contribuem para um mundo melhor. E tudo o que importa é esse sentimento, é esse aliás o centro de gravidade da mulher, como ela se sente. Acede ao mundo com os olhos do seu corpo, e o seu corpo é também o seu mundo. Mas, extrapolo, e ela farta-se de estar com a cabeça repostada no meu ombro. Espreguiça-se e pergunta-me se quero dar um passeio à beira do rio. Digo-lhe que isso não é um rio, mas um estuário. Não sejas chato, e puxa-me para ela, sempre escolhendo as expressões faciais que ensaiou em inúmeras relações passadas, na tentativa de me controlar a percepção. Ao ver as gaivotas passar alheias às carradas de turistas que não param de chegar, ela empurra com força a minha mão para a frente e para trás, em gestos exagerados que visam que eu pense que o indivíduo age sem segundas intenções, movida apenas pela pureza do seu sentimento, naquele lugar e naquele instante. Aproveito a brisa que sobra e peço a mim mesmo para me calar pois é impossível ser espontâneo nestas condições, em que o macaco interno não pára de dizer merda. Se fosse possível acreditar, se fosse possível ter esperança. Mas não é. Sou avassalado por estas ruminações intermináveis. Passo a vida a ouvir a minha própria voz a explicar-me como são as coisas, como se um cego precisasse de tradução. Convida-me apressadamente para ir a casa dela, beber um chá. Que as noites estão frias. Para me controlar a percepção, de novo, diz que não é costume nela convidar ninguém, assim, para casa dela. Mas que a faço sentir tão segura e bem, que não se importa de parecer leviana. Fica a olhar para mim, a ver se comento. Apenas digo, que sim, vamos. Esperava que tivesse os filhos na mãe, na irmã, numa amiga. Mas não, estavam em casa, com uma ama informada previamente que teria de fazer umas horas a mais. Bem, lá se vai a macacada horizontal, pensei eu. Mas quando caí em mim, analisei o carácter prematuro de me apresentar aos filhos, ele com 6 anos e a mais velha com 8. Ele estava a brincar com carrinhos e a ver os desenhos animados, ela a brincar com uma casa de bonecas. Ao verem-me entrar pela porta, ficaram a olhar para mim, a tentar fazer senso de quem eu era. Em ambos percebi um ar cansado que me revelou que eu não era o primeiro projecto de substituto em part time, do pai que os vinha buscar ao fim de semana. Era comissário de bordo, e passava a maior parte do tempo fora. Disse-lhes olá, responderam-me de forma igual. Ela disse para me sentar, que ia ao wc e já voltava. Sentei-me e meti conversa, já sabia os nomes, queria saber a que estavam a brincar. Ele não me respondeu, e a miúda disse que estava a brincar com as bonecas, que uma se chamava Sónia e o boneco masculino, Rogério. Eu perguntei se ela conhecia algum Rogério. Ela disse que sim, que era o namorado dela na escola, mas que ainda não sabia, porque ela ainda não lhe havia dito. Eu perguntei, que gostas dele? E ela respondeu, «-Não, que vai ser o meu namorado.» Confesso que a resposta me desarmou, e não quis estar a insistir com a criança, sobre assuntos sentimentais, pois é inapropriado e de um certo ponto de vista, estúpido. O rapaz voltou a brincar com os carros, chocando-os uns contra os outros e fazendo sons das explosões como via e ouvia na televisão, e ela, atarefada no mundo faz de conta metendo ambos os bonecos a andar de mão dada e fingindo as conversas, como se ventríloqua omnisciente. Por vezes aumentava o volume da voz, para garantir que eu ouvia, a ver se me captava atenção para a sua brincadeira. Eu estava a ser testado, estava a aferir o meu grau de compromisso com a mãe, com o querer agradar à mãe, através dela, fazendo-me interessado na brincadeira, acedendo ao seu poder de criança, que é aquele cheque em branco que todos damos, pelas crianças o serem. Enquanto aguardava, ia reparando no enredo da brincadeira dela, no como se enquadrava Rogério na história, de como era adereço nos planos de Sónia, ao irem às compras juntos, ao irem para casa fazer o jantar e até na forma como ela os dispunha na cama na hora de dormir. Acabei por me amigar profundamente com ambos. Passado o período de me verem como apenas mais um gajo que ia lá a casa para comer a mãe, lá largavam de vez a vez, as suas lamúrias sobre o mundo que os rodeava. E eu fazia com que percebessem que isto é apenas um animatógrafo, onde apenas a alma conta, apesar de todas as aparências. Tenta lá explicar isso a crianças. Enquanto brincavam na sala, dei um fodão na mãe deles, no quarto. Tenho a certeza que sabiam que quando a mãe me pediu para ver a ligação da TV que não estava a funcionar, que era para que a mãe cedesse algo de lúbrico e secreto, e habitual sempre que um novo homem entrava na sua casa. Ela tinha a custódia, o pai, os fins de semana. Ou parecido. Com os tomates vazios, não podia vogar sozinho pela casa, e portanto, sentado no sofá, lá metia conversa com a miudagem, que a custo me respondia ao início, mas que a meio das conversas era interrompida, com novos chamamentos da progenitora acerca da qualidade da imagem televisiva. Chegado ao quarto dizia que só com mais sinal a imagem melhoraria. E ela respondia que por certo era um problema do cabo, que precisava de verificar que estava bem inserido. Quando já gemia, eu lhe perguntava se o sinal melhorara. Não me respondia. Eu não me sentia bem a foder, com os miúdos na sala. Se fosse pai não faria o mesmo. Mas eu não mando em casa alheia. Afeiçoei-me a ambos, e após sentir o abraço de ambos, na Disneyland francesa numa semana que fomos para lá, quer dela quer dele, tornámo-nos amigos para a vida, pela minha emoção e pela sua tenra idade. Eles sabiam que eu me esforçava e que não era um dos que ejaculate and evacuate. Ela era agradável, a início. 2 Como qualquer camaleão. Lera-me bem. Muito bem, demasiado bem, que até assusta. Um conas sedento de relação humana e equivalente, pronto a explorar por via da sua idealidade crónica. Predadoras destas eram já para mim, um lugar-comum. Tem uma cona e um útero, e escolhe livremente o gajo que lhe garanta prole ‘atraente’ para as gerações futuras. Como não consegue manter o portador de pila, é levada ao colo pela sociedade matriarcal. Garantida a maternidade, há que garantir o apoio ulterior por parte de um macho cujo valor sexual se subsume a levar com os restos alheios. E é nisso que se enganam, todas. Finjo-me de parvo, diferente do parvo que realmente sou. De tal forma que ficam à vontade por não saberem que eu sei pelo que passam, como pensam. Grandes broches de meia hora, até doer o maxilar, dá o cuzinho sem qualquer protesto, morde o ombro enquanto a como por trás, mas pensas que é espontâneo, ou apenas a coreografia ensaiada para levar os ratos ao som de um instrumento de sopro até à sua morte? Assim que sente que a vítima mordeu o anzol, a foda passa a ser anual. Quando a vítima estrebucha, corta com ela, sem qualquer assomo de consciência aparente. O alter ego ainda lhe segreda, ó puta, isso não são formas de tratar as pessoas. Mas o mesmo sentimento que permite o camponês matar o porco que lhe comia os restos da salada à mão, emerge, e expõe com uma crueza inigualável, este é o mundo mata ou és morto. Numa noite de bebedeira, sem querer, carregou na tecla de chamada telefónica por Whatsapp. Atendi e ouvi o que ela e as amigas falavam das fodas e amigos que tinham. Após meia dúzia de garrafas de sangria, todas balbuciavam sobre sombras passadas, sobre homens que as haviam marcado. Nenhum desses as haviam tratado com a consideração que exigiam aos novos pretendentes de Penélope. Nessa fala, não pensada de antemão, ela confidencia que chuparia de bom grado, a pila do ex marido. Em honra da justiça há uma amiga que lhe pergunta pela pila do gajo que agora está com ela. «-Está com os nossos filhos em casa.» As outras riram-se com um deleite análogo ao acto de domar um hipopótamo a usar um cagatório de gato. Ao ouvir, calmamente, a forma como realmente pensava em mim, dirigi-me ao quarto da miúda, e dei-lhe o meu cartão. Disse-lhe para me contactar, fosse o que fosse que precisasse. Dei-lhe um grande beijo na testa. Chorámos juntos, ela como que percebendo porque sabia o motivo pelo qual eu me ia embora. Mas não podia ficar, a não ser que não me respeitasse…e disso estava farto. Com ele, foi o mesmo.Pedi-lhe perdão, disse que gostaria de o ver crescer, mas que não podia. Liga-me para este número, se e sempre, que precisares. Não te esquecerei e estou aqui para vocês.
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