Na última bancada do 329 que vai do vómito oriental lisboeta ao Campo Grande, ele, eu, ia olhando no dentro dos olhos dela dando seguimento ao coro bem batido que granjeara toda a atenção da jovem ninfeta.
Os meus bíceps já não tinham o ou a H2O de outrora e a pele não estava tão esticada, mas, o exercício constante ainda os fazia sobressair sobre uma população ou obesa ou homossexual. A miúda, Clara de nome e de pele, olhava-os com um fascínio que o, me, desconcertava. Estive para dizer que era da punheta, mas deixei-me estar calado. Tivesse tanto músculo na zona do ventre como na que exerce trabalho braçal e tinha metade das gajas de Lisboa a pedir sevícias sexuais à minha pessoa. Excepto se houvesse executivos de chinos e camisas brancas sob bronze de solário. Esses é que levam as dondocas todas. Eu metera conversa agressiva sobre a sua mala escolar demasiado grande impedir a respiração da minha tomateira que exigia pernas bem abertas. A donzela havia notado que as pernas afastadas, minhas, lhe cerceavam a liberdade de movimentos. Daí a fazer-lhe ver a injustiça de autocarros comprados em segunda mão à República Federal Alemã, os cujos a Rodoviária lisboeta nem se dava ao trabalho de remover os avisos de achtung , foi um ápice. As pupilas dilatadas certificaram-me que estava interessada, ali pela zona do Prior Velho. Ao parar no Campo Grande, já nossas bocas se haviam encontrado. O suor primaveril que emanava dos seus sovacos, a ingenuidade com que sua língua tacteava rapidamente a minha cavidade bucal, certificava-me que ela me tentava impressionar ou revelar destreza amorosa, não se querendo ficar atrás, pelo menos da minha língua globetrotter bucal. O tactear das minhas mãos pelo seu dorso revelara um apara mamas com presilha dobrada sobre si, de forma ostensiva, o que demonstrava a falta de brio compreensível nesta idade, porque com uma cara e corpo daqueles, cuidado com pormenores é desnecessário. O seu olhar para a minha boca exprimia aquele fatalismo cósmico que arrebata todo o ser de alguém, como que emulando a verdadeira paixão. Saídos perto do Museu de Lisboa, beija-me inusitadamente querendo fingir espontaneidade, à qual respondo com um puxar para mim da sua pélvis com a força dos braços alimentados a masturbação recorrente. Ligeiramente mais baixa, apertei-a tanto que a elevei no ar, em frente à Faculdade de Ciências. Ela não quis ir para as aulas, fomos ver os patos para o lago mais próximo. Vinte e quatro anos e cabelo louro reflectindo o céu que sorria acima. Morava num quarto de uma tia, vinda das entranhas nacionais, com mentalidade à frente, apesar de nova. Sem que lhe perguntasse nada, revelou-me as suas conquistas, poetas, filósofos, músicos, arquitectos, e naquilo que as mulheres são melhores, a linguagem, espalhava-se ao comprido, revelando o seu modo de pensar através das palavras escolhidas. A forma como falava revelava já um fatalismo no qual pairava desgosto de amor intenso e prévio. Afagando-lhe a cara, não lhe disse que eu era diferente. Disse-lhe que a má imagem que tinha dos homens era devida ao seu sistema reticular, escolhendo o pior dos outros para ver. «-A minha tia não está em casa.» Disse-o enquanto eu discorria uma das minhas teorias idiotas. Parei e algo falou em mim por mim. «-Clara, dou-te um fodão que os teus antepassados vão sair da cova a vomitar com o enjoo dos abanões.» «-Quero ver isso.» respondeu. Ali para a zona de Xabregas, a janela mostrava um astro que se escondia por detrás do nosso, e a sua pele suada reflectia a bênção de um novo mundo para mim que agradecia ao Deus de todos, por causa desta celebração de vida. A pila não havia forma de esmorecer, nem ela de se enfadar e parar. Como que se estivesse a cumprir promessa indo a Fátima de orgasmo, entregava a nuca ao travesseiro exalando monossílabos de prazer enquanto lambia o meu próprio cuspo da sua pele da cópula anterior. «-João, fala-me dos teus amores infelizes.» «-Não, não merecem, se são infelizes não é por minha culpa, que fico sempre até ao fim como mestre de cerimónias.» Contorcendo-se contra mim, e soltando pequenos gemidos, deu para perceber que atingira o clímax. «-Com pedidos desses, vais-te apaixonar por mim Clara.» «-Isso é o que vamos ver.» Não perdeu tempo a negar-me essa confiança inabalável em mim. Reconhecendo-me essa capacidade. Não me chamou convencido. Não me designou de arrogante. Pura, apenas disse concordar com o jogo. O lóbulo da orelha assentava bem na minha língua, que se entretia enquanto a refracção fazia efeito. A sua total entrega era inebriante e o convite ao naufrágio. Bastava eu acreditar na verdade que ela fingia acreditar. «-O meu padrasto abusou de mim, durante um ano antes de se separar da minha mãe.» Perdi a tesão toda e fiquei deveras enjoado. Que podia fazer além de me abraçar a ela e chorar. Foda-se que caralho. «-Lamento. Não sei que te diga.» Esbocei uma teoria do homem ser lobo do homem, como se isso desculpasse uma má desculpa de inferno que é este mundo. A intenção de ser médico na aflição de outro é contrária à minha natural sensibilidade, a sensibilidade aguda com a ferida do outro apenas acentua o efeito da dor no outro. Havia que ser bruto. «-Aprendeste alguma coisa com ele?» «-Como podes dizer algo assim?» «-Caga, todos temos uma história triste.» «-É verdade.» «-Que é feito desse filho da puta?» «-Foi esfaqueado no rabo, demasiado acima, na Turquia, por um grego. Está paraplégico há uns anos.» Levantando-se da cama de solteira, começou a vestir-se argumentando que tinha de ir para Lisboa ter com amigas, para um jantar de aniversário. Ali pela Avenida de Roma apartámo-nos. Vestida de vermelho mini saia diluiu-se na noite. Ao regressar a casa de Metro, perguntei-me como a testaria. Aposto que ela fez o mesmo pois mandou-me um sms a dizer que se havia homem da vida dela, eu seria o que mais próximo se aproximara. Ingenuidade ou jogo? Dou o benefício da dúvida. Decidi alternar com períodos de quente e frio. Ligava-lhe duas vezes por dia comunicando as minhas saudades. Quando a sentia afastar-se, como sempre, sempre, sempre acontece, afastava-me eu. Ela quando sentia que eu estava a distanciar-me, começava a perseguir. O ciclo repetia-se. Evitou copular mais, não por falta de atracção, mas para deixar o elo emocional em territórios de ainda controlável. Eu, percebi. Também percebi que não fora a minha destreza oratória, ou originalidade de discurso a granjear o acesso ao punani dourado. Apenas o qualquer coisa em mim. Noutros tempos teria ficado em suspenso da donzela, por causa da sua inamovível peregrinação por todo o local que a excelsa Olissipo faculta para edificação dos patrícios. Ora eu não preciso de mulher alguma para o meu crescimento espiritual, e para apreciar o estar com a minha própria companhia. Nem havia, portanto, que a engodar com a promessa de uma relação futura, só proposta pelos conas que pretendem garantir a disponibilidade da vulva no futuro, nem que seja por obrigação matrimonial. Comungando na religião cuja doutrina assenta na mulher como centro do nosso propósito. A mulher como ponto de fuga de uma existência que fomenta a fornaça de um desespero que não se anula senão na distracção oscilante entre dois seios e duas nádegas. Percebi que ela começara a compor um mundo de desqualificação da minha pessoa, para mascarar a sua falta de coragem profunda. Se eu fosse um cabrão, podia mascarar as consequências das suas acções, alijar responsabilidade. Se eu fosse o culpado de tudo, o seu capricho, a sua imaturidade, a sua responsabilidade sobre os sentimentos de outro, ficariam afogados em vergonha. Conheço bem a táctica e não lhe a facilitaria em nada. Só por causa da deslealdade. Seria o cílio cravado. Ela que não pensasse que seria mais um troféu, um gajo que fodia no anonimato do seu anzol em forma de jovem corpo. Havia de ser uma lembrança incómoda, irritante como mosquito, uma reflexão em frente a seus olhos, da futilidade que ela própria em si não queria encarar. É o meu papel mais comum, armar-me no espelho do outro, de forma a revelar-lhe a fantasia que compõe de si, para poder viver consigo próprio. O que vistas bem as coisas, me torna contra-natura e pior ainda. «-Clara, és uma cobardolas. Fazes o necessário para proteger o teu couro. O outro que se foda. Salva-me a espessura do meu. Senão continuavas a trucidar sonhos alheios como andando em papel de arroz.» O impacto das acções nas emoções de outro, são como a pimenta em rabo alheio. Além de mim existiam milhões na metrópole, portanto nunca lhe faltaria palco. Perdia tempo nas redes sociais a anunciar os gatinhos abandonados e a censurar a maldade dos homens, mas naquilo que podia ter acção directa, espalhava-se ao comprido. É que nem via como problema. Supostamente, o sentir era problema do outro. Um pouco como agiota que lucra da ingenuidade alheia. E eu sempre lá, como padrão assinalando a presença da pátria, a pátria da hipocrisia. És uma cobarde, Clara.
1 Comment
C.
23/9/2019 01:52:35
Foste um espelho bonito de se ver, mas ao espelho só me vi a mim própria.
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