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Purgatório de um não baptizado IV

18/11/2021

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Ligou-me eram 23 horas certinhas.


«-Ó filho da puta, estavas a referir-te a mim quando escreveste o texto…eu fodo-te a vida… tu não sabes com quem te meteste…»


Desliguei-lhe o telemóvel na cara, mais preocupado com a dor de cabeça decorrente de 6 heinekens de penálti, que com as ameaças.


Fui ler o texto, e nem o nome dela coincidia, porventura serviu-lhe o chapéu, e o homem amestrado que tinha em casa lia o blog. Merda antiquada essa dos blogs.
 

Só assim se justificaria o pânico dela. Mas por que raio de motivo ele poderia ler o blog?
Ou usavam o mesmo computador, ou ela havia usado a minha personagem para lhe fazer ciúmes, sujeitando-o cada vez mais numa chantagem emocional que o diminuía como homem, e que o fazia esforçar-se mais por aprovação…já dizia o outro, tudo tem a ver com sexo, menos o sexo…que tem a ver com poder.
Ao insinuar que havia competição, manipulava o trongo a esforçar-se mais, a ceder, nos raros momentos em que se sentia tão diminuído, que o amor próprio o forçava a dar gritos de Ipiranga, a rebelar-se contra a dona tirânica, que lhe dava a vulva e uma razão para viver por via do sentir-se vencedor por ter acesso a um útero estéril.
 
Um dos meus melhores amigos liga-me e diz:

«-Óh boi, amanhã passo por tua casa de manhã para irmos tomar café.»



Ao terminar a frase acabo por adormecer, e só acordo com o toque à campainha na manhã seguinte.
Mijo, lavo-me e levo a cadela à rua, com o olhar incrédulo dele que me espera dentro do carro falando com outros amigos que lhe preenchem a vida com o placebo da presença telefónica.

Vamos a uma pastelaria perto de onde ela mora.


E eu, foda-se, isto pode dar merda.

Bebo o café, e repito a mesma merda de sempre, que as sessões de cerveja visam afogar mágoas mas que estou a dar cabo da minha saúde férrea.


Nem tinha acabado a minha promessa de sobriedade e ouço o impropério «- Óh filho da puta, estás aqui!»
Tentam ofender a nossa mãe, porque sabem que na maior parte dos gajos bimbos tal é uma espoleta para desnorte, o objectivo é apenas provocar uma resposta emocional tresloucada que faça o ofendido perder as estribeiras, e assim, passar por bruto imbecil. Manipulação no seu melhor.


Fingi que nem era para mim.


A atmosfera ficou tensa, e sinto a minha cabeça empurrada para a frente por uma mão fria, que transmite a frustração do meu propositado ignorar da voz.


Olho para trás e vejo-a com o animal de estimação bípede.


Pronto fico com a certeza de que a merda bateu na ventoinha e espirrou para todos os lados.


A dor de cabeça azucrina-me o raciocínio, e enterro o rosto mais na direcção da chávena vazia na mesa, a ver se o rodopio de poeira passa com o meu desprezo pelos sedimentos alados resulta.


Uma mão com mais força que a de uma mulher zangada pousa-me no ombro.
Pronto, já não há como escapar.


A fraca figura de um gajo carcomido por dentro, dispõe-se à minha frente, contrariado nos olhos, por ter de enfrentar outro, mas tentando vencer essa contrariedade por via de uma clara crença de que os homens a sério mostram a sua validade às gajas, impondo-se a outros.


Julguei até ver a esperança de uma foda esforçada e húmida nos seus olhos, como prémio de ter esmurrado outro, é que sabes, essa merda faz com que fiquem molhadas, go figure...


Apoio o queixo na palma da minha mão e fico a encará-lo de frente, com ela passando para segundo plano, falando alto para que todos a ouvissem na esplanada de forma a justificar a justeza da violência que se preparava para acontecer.


E eu pergunto, «-Dude, tás parvo?»


«-Deixa de te meter com as mulheres dos outros, cabrão. Arranja mulher para ti, punhetas.»


Mais que os contextos, tentei perceber o que fazia ele da situação, e que ela levara a manipulação demasiado longe, esquecendo-se de mencionar, que não só eu negara os seus avanços, como ela os iniciara.


O meu amigo conhecendo os três, permanecia calado e de boca aberta, pois as várias vezes que faláramos de gajedo, ficara patente que a minha visão era realista, o que nos dias de hoje é sinónimo de ginecofobia.


Ainda perdido na cogitação sobre quão fácil era manipular um homem menor, aquele que sabe que por não ter valor próprio, tem de se anular para poder procriar, senti um impacto forte no queixo, após o qual um sentimento de ardor se seguiu, e ainda sonhei ficar inconsciente, já que a cerveja e o vinho verde só me recordam do fosso entre os meus amores passados enquanto são, e o que eram para mim. Pequenas maravilhas da Criação, a meus olhos, que afinal se revelaram, humanos com feios defeitos de ausência de carácter e introspecção.


 
Levantei-me para ir embora, mas a minha ausência de resposta fez com que acreditassem na minha culpa, e não no querer evitar algo doloroso para todos.


Ela então deixou enfunar a sua vela de indignação, afinal a maior culpada, avançou na minha direcção e com a mão na minha cara arranhou-me a face esquerda com as unhas de gel merdoso, que são adorno para quem não quer ser objectificado sexualmente.
 
Um diferente tipo de ardor, e aqui já nada podia fazer, estava cego, pela injustiça do tratamento.
Avanço na direcção dela, e o tipo presenteia-me com um soco bem encaixado na minha maçã do rosto direita.
Não me deitou abaixo, apenas ficou a doer. Afinal que fizera eu, para que estes dois canídeos achassem que a minha anulação reforçava o seu amor?
 
O meu ego fervilhava pela injustiça, a adrenalina soltava-se lentamente, o medo e a raiva faziam amor, cada um virando-se para o seu lado na cama comum, à espera que o outro perseguisse.
Olhei para o bacano e disse: «-Mano, eu nada fiz, nada provoquei, mas tu não tens problemas em agredir outro, apenas baseado na palavra da tipa que te tem pelo beiço?!»
 
A tentativa de ser razoável apenas confirmava a minha menoridade e o carácter inofensivo a seus olhos.
Um pontapé em cheio no meu quadríceps direito, fez-me a perna ficar dormente, pois quando avancei para ele e aterrei a minha testa no seu lábio, que se abriu como porta de banco às 9 da manhã, fui a coxear.


Após o ver voar pelas mesas da esplanada partindo o vidro temperado da vitrina, dirigi-me a ela, que apanhada de surpresa duvidava que eu conseguisse ou me atrevesse a bater numa mulher, afinal a autora moral do crime.
A minha canela esquerda varreu-lhe ambas as pernas do chão, e ao cair, o rosto bateu no balcão de mármore, de esquina.


Inanimada no chão, dirigi-me ao potencial de resposta, que sacudia ainda vidro do pescoço.
Agarrei-o pelos colarinhos, levantei-o, e projectei-o na direcção oposta, onde se encontrava a mesa intacta, que partiu facilmente com as costas.


Ao abrir os olhos, grogues e cambaleantes, disse-lhe : «-Mas tu achas que me meto com as mulheres dos outros?»
Do outro lado, uns olhos tristes e quase a fechar, não faziam caso do que eu dizia.
Uma pena imensa tomou conta de mim, como se tivesse batido a um deficiente que não tem culpa da sua inadequação social.
 
Deixara que a minha ira tomasse conta de mim, por causa de uma frustrada que manipulara o prémio de consolação que seus olhos determinavam.


O tipo ensanguentado e desmaiado à minha frente funcionou como epifania que me trouxe as lágrimas aos olhos.
Há uns minutos não se importaria de me sacrificar para melhorar a sua vida amorosa.
Agora era eu que lamentava o seu destino.


Pousei-o no chão, de lado, para que o desmaio não o sufocasse pela posição da língua, e preparava-me para ir embora quando a Polícia de Segurança Pública chegou.


Vistas as filmagens CCTV, foi confirmado que agira em legítima defesa.
Às vozes à minha volta eu só pensava no mísero destino daquele tipo.


Ao como é difícil falar sobre a natureza feminina que não seja agradável e cor-de-rosa.
Aparentemente os homens têm o monopólio de falhas de carácter.
 
Ele acreditara que o navio havia finalmente chegado ao seu porto, quando ela se riu meia dúzia de vezes para ele. As manhãs intermináveis de levantar-se a horas cama, para ir trabalhar no armazém de peças auto, haviam finalmente compensado, garantindo uma vulva cuja dona sonhava com os badboys passados fazendo amor com ele.
 
Ele contentara-se com o prémio de ser o prémio de consolação de alguém que se divertira enquanto o corpo permitira, e que finalmente se tornara acessível, não por ele, mas por falta de ofertas.
 
Na mais profunda tristeza de lamentar este mundo cão em que todos partimos as vitrinas ao cair na realidade, lamentei a violência exercida sobre ambos.
 
Felizmente ninguém se levantou por ter batido numa mulher.





​
Antes levar mil murros na cara, que encarar a verdade.
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